sexta-feira, 30 de setembro de 2011

JANELA DO DIA


No findar da tarde de ontem, Isaltino de Morais, foi preso.

No findar da tarde de hoje, Isaltino de Morais foi libertado.

A justiça portuguesa no seu melhor.

“O que aconteceu, naturalmente, não deveria ter acontecido. Em bom rigor, não poderia ter acontecido mas o estado de direito é feito também de erros porque os decisores são humanos como todos nós", disse o autarca.

Se, eventualmente, Isaltino de Morais pedir uma indemnização ao Estado, vamos ser nós a pagá-la!...

IDÍLIO EM BICICLETA


“Ah! há mais qualquer coisa… Em Costa, era Domingo à tarde e dei por mim no campo de futebol de cinco. Faltava um jogador para completar as equipas e fui convidado a juntar-me aos craques que, no fim da peladinha, queriam contratar-me como guarda-redes, depois da mão-cheia de defesas vistosas! Só pensava: “que disparate, e se me lesiono…” mas continuo incapaz de resistir a uma partidinha de bola, ou a dizer “não” se falta um tapa-buracos… e recordei com saudade os compinchas e as jogatanas dos Domingos, em Carnaxide.”
                                           
Texto e imagem de Idílio Freire.

OS CROMOS DO BOTECO

QUANDO O SOL SE PÕE


Nos países tropicais, o sol cai para dentro da noite, despede-se demasiado depressa.

Maria Bethânia:

“Faço análise á muitos anos para aguentar o pôr-do-sol.  Me angustia: não é dia nem é noite. Minha mãe também não gosta, dizia-me: “Acenda a luz que vai escurecer.”

Bethânia, que até leu Fernando Pessoa, sabe que Álvaro Campos escreveu isto:

”Não sei como é que se pode achar um poente triste.
Só se é por um poente não ser uma madrugada.
Mas, se ele é um poente, como é que ele havia de ser
uma madrugada?”

Legenda: imgem de Idílio Freire

OS ANTECEDENTES DA EXPO 98


No dia 22 de Maio, abriram-se as portas da Expo 98, a última exposição mundial do século XX.

A 30 de Setembro, após uma festa, que durou para além do nascer do sol, acabava a Expo 98.




No dia 22 de Maio, abriram-se as portas da Expo 98, a última exposição mundial do século XX.

A 30 de Setembro, após uma festa, que durou para além do nascer do sol, acabava a Expo 98.





Há quem tenha a opinião de que é demasiado tarde.

Por alturas de 1996, no meio de um ensopado de enguias , em Cacilhas,juntamente com o António Abaladas, surgiu a ideia de tirar fotografias a locais onde iria surgir a Expo.







A ideia completava-se com tirar de fotografias, aos mesmos locais, já depois da abertura da exposição.




Por motivos que agora não lembro, o Abaladas, também não, o projecto não avançou.
As fotografias pós-Expo nunca foram tiradas.





O caderdinho onde foram tomados apontamentos vários, perdeu-se.






A revelação das fotografias pré-Expo não foi famosa e o tempo acabou por aniquilá-las um pouco mais.






Estão aqui algumas dessas fotografias.

A Expo 98 antes de o ser.




.Alguns números, não oficiais, colhidos aqui e ali, sobre a EXPO 98:

Aquando do lançamento do projecto da EXPO 98, foi transmitida a ideia de que “se pagava a si próprio”.




Com rigor ainda não se sabe quanto custou.

Em Julho de 2000, ficava a saber-se que custara 13,6 milhões de contos aos contribuintes.




São 96,6 milhões de diferença entre as receitas realizadas e as previsões que se fizeram. Com 9.700.000 visitantes, ficou a 62 por cento da mais pessimista das previsões.
A justificação encontrada aponta para cálculos errados nos custos de operação.




A construção do Pavilhão de Portugal teve um custo final de 5,3 milhões de contos, com um desvio aproximado de 150 por cento.




A Gare do Oriente calculava-se que custasse cerca de 21 milhões de contos acabou por custar 33 milhões de contos.

O Pavilhão da Realidade Virtual tinha um preço contratado de 723 mil contos acabou  por custar 990.914 contos.

11.114 pessoas estiveram envolvidas na sua construção.




160 países e organizações internacionais estiveram presentes.

4.600 espectáculos, envolvendo 60 mil artistas

Destes espectáculos, 235 decorreram no Palco 1 da Praça SONY.

Em Agosto de 1988, no “JL”, o jornalista Rodrigues da Silva, escreveu:

“… há que temer pelo futuro daquela arquitectura. De pé ficará, mas rodeada urbanisticamente de quê?”

quinta-feira, 29 de setembro de 2011

JANELA DO DIA


1.

Um protocolo assinado, em 1995, entre a Câmara Municipal de Lisboa e a Fundação Mário Soares, determina que até 2015 o município forneça, anualmente, um apoio de 50.000 euros.

Segundo o “Correio da Manhã” vai a votação camarária, a atribuição de um subsídio de 14.825 euros como apoio financeiro para o prolongamento, até ao dia 31 de Dezembro de 2011, da exposição ‘A Voz das Vítimas’, organizada pela Associação Movimento Cívico Não Apaguem a Memória" e pela fundação.


2

As fundações com actividade em território nacional serão extintas temporariamente até ao final do ano, período em que o Governo avaliará a sua viabilidade financeira depois de as instituições entregarem a documentação necessária, disse fonte ministerial.
Fonte oficial do Ministério das Finanças explicou que "as fundações ficam extintas mas de forma temporária", ou seja, têm 30 dias para "mostrar as contas" e o Governo tem os 60 dias seguintes para avaliar cada caso. Depois deste período, o Executivo "pode levantar a extinção se estiver assegurada a sua viabilidade económico-financeira" ou passar a medida para um regime definitivo.

3.

Alberto João Jardim ontem, em camapanha eleitoral na Madeira.
“Tenho orgulho de ter feito dívida. Abençoada dívida.”

4.

Ricardo Araújo Pereira na “Visão”:

“A cronologia dos factos é interessante e difícil de acompanhar. No domingo, Jardim negou que houvesse dívidas. Na segunda-feira, admitiu que havia dívidas, mas negou que as tivesse ocultado. Na terça, admitiu que tinha ocultado as dívidas em legítima defesa da Madeira. Na quarta, negou ter admitido que tivesse ocultado as dívidas. Hoje é quinta, e não se sabe ainda o que vai dizer - e nenhum de nós tem imaginação suficiente para se deitar a adivinhar.”
 5.

Adelino Maltês, no “Diário de Notícias” sobre a entrevista do Presidente da República:

“E acabou dizendo que temos mais "sorte" e somos mais "felizes" que a Grécia, porque pode haver consenso entre PSD/CDS e PS, através do "diálogo permanente". Isto é, procurou condicionar Seguro a não ser o indisciplinador, para que haja "esperança" e "imaginação". Por outras palavras, o Governo pode ser sempre troikado. Só não sabemos é quando.”

ASSALTO À EMBAIXADA DE ESPANHA



Setembro do “Verão Quente” de 1975, aproxima-se do fim.

25 de Setembro

Uma manifestação organizada pelos S.U.V. a que se juntaram milhares de trabalhadores concentrados, no Terreiro do Paço, seguiram até ao Parque Eduardo VII. Antes passaram apelas instalações da “Rádio Renascença” e do jornal “República”, onde gritaram palavras de ordem de apoio “à justa luta dos trabalhadores daqueles dois órgãos de co0municação social”.

Da reportagem do “Diário de Notícias”:

“O orador anunciou, então que iria ser tentada hoje à tarde a libertação dos dois militares que se encontram da Casa de Reclusão da Trafaria. Foi nesse momento que a multidão começou a gritar “Para a Trafaria já”.

E dando cumprimento à palavra de ordem dos manifestantes, ali mesmo na Praça do Marquês de Pombal, começou a fazer parar autocarros que seguiam as suas carreiras normais e, ordenando a saída dos passageiros, tomavam os seus lugares dirigindo-se para o presídio, na outra margem do Tejo.

Entretanto outro grupo de manifestantes foi à estação das Amoreiras e trouxe de lá nada manos que 41 autocarros que, superlotados, seguiram a mesma rota. Cerca das duas da madrugada informavam que tinham sido desviados cerca de 70 autocarros. Muitos automóveis particulares encaminhavam-se também para a Trafaria.

Pouco depois das duas horas soube-se que Otelo Saraiva de Carvalho, em contacto telefónico, ordenara  a libertação dos dois militares.

Foi o delírio com toda agente gritando: “Vitória, Vitória!”



27 de Setembro de 1975

A Embaixada e o Consulado de Espanha são destruídos por manifestantes.

Da reportagem de “A Capital”:

 “Os edifícios do Consulado e da Embaixada de Espanha foram completamente esvaziados e o conteúdo destruído ou incendiado na sequência de uma manifestação convocada, à uma hora da madrugada de hoje, por um comunicado da U.D.P., transmitido aos microfones do Rádio Clube Português. O comunicado apelava para uma concentração frente à embaixada de Espanha com a finalidade de protestar contra as condenações à morte dos militantes da E.T.A e da F.R.A.P., julgados em Burgos e Madrid, por tribunais onde os advogados de defesa não puderam exercer os seus direitos.
Um dos elementos do serviço de segurança da manifestação anunciava pelo megafone:

“Isto não é um acto selvático, camaradas. Temos de sentir esta acção como um acto de solidariedade para com os compatriotas e antifascistas bascos condenados à morte pela ditadura do assassino Franco.”

José Gomes Mota, no seu livro “A  Resistência”:

“São assaltadas e saqueadas as dependências da representação diplomática de Espanha em Lisboa, uma criminosa atitude a que casualmente assisti na companhia de Mário de Aguiar, e que considero o expoente máximo do vandalismo “revolucionário”; a cúmplice passividade das forças militares do Copcon perante aquele dantesco espectáculo, dava infelizmente a ideia de que a revolução portuguesa tinha “eleito” como alguns dos seus heróis os aventureiros mais reles da ralé “revolucionária. Por mais anos que viva não será fácil esquecer aquele inacreditável tragédia, a desafiara a mais fértil imaginação dos mais repelentes incendiários.”

Legenda: Títulos do "Diário de Notícias", respectiavmente, de 26 e 27 de Setembro de 1975

IDÍLIO EM BICICLETA


“There was a time… boa colheita!!

 El Bolsón é uma bonita cidadezita, localizada num vale cálido, um autêntico microclima, onde se produzem cerejas, morangos, framboesas – a capital das “frutas finas”, como se auto-intitula – para além de explorações de trutas e respectiva transformação, queijarias e a maior diversidade de artesanato que vi na Argentina, so far. É uma cidade-aldeia onde a vida parece decorrer devagar, com gosto, paixão mesmo, centrada em pequenas coisas e no equilíbrio do homem com a natureza, a ecologia e a sustentabilidade. Ah!, e geladarias, pastelarias e chocolaterias… O Cláudio, marido da simpaticíssima Valéria, proprietários do Pehueina hostel, não podia ser mais brutal na conversa que tivemos antes de deixar El Bolsón rumo ao sul… “a Patagónia Argentina é uma m…, deserto e mais deserto, vento e tempestades, frio e neve, centenas e quilómetros sem vivalma, numa monotonia e desolação total. O marketing vende-a como algo místico, romântico, deslumbrante, mas é uma trampa. Daqui a quarenta quilómetros acaba este microclima temperado e ameno, vais apanhar o pior clima que possas imaginar e só deserto. São 900 quilómetros de fantasmas e mortos. Não há pessoas… Pelo lado chileno, sim, a carretera austral leva-te por lagos, rios, com vistas fabulosas pela cordilheira andina. Mas é verdade que nesta altura do ano, em pleno inverno, deve haver muitos troços intransitáveis e é perigosa. “Mira”, mesmo que vás pela ruta 3, a “costera”, é a mesma porcaria. No Brasil a estrada bordeja o mar e a vista é bonita, mas na Argentina nem isso: é interior e pelo deserto… feia, feia! Se quiseres, tenho amigos “camioneros” chilenos que fazem esta ruta, até Punta Arenas, falo-lhes e dão-te boleia até lá, ou onde quiseres ficar, e depois prossegues para o Ushuaia, que não é muito melhor…” Assim foi o meu amanhecer, animado e moralizador. Fiz um longo silêncio e disse-lhe que ia pensar um pouco – apenas para não mostrar um absoluto menosprezo pelo que me acabara de transmitir. Não fiz 28000 quilómetros, pedalando por “sendas, monte e vales” para desistir de chegar ao Ushuaia pedalando. Também não lhe ia explicar que esse tipo de paisagem, dureza e monótona solidão, fazem parte de um todo, têm lugar na aventura de uma vida, são o sal e o vinagre que temperam o manjar.”

Texto e imagens de Idílio Freire

MEMÓRIAS


Este é o cartão do associado nº 38315,  de "A Voz do Operário" de Afonso Borges Correia, meu avô materno.

Funcionário da Câmara Municipal de Lisboa, republicano histórico, era um pândego patusco, castiço, um gozador da vida, tocava “caixa” na Banda da Câmara.
Nos domingos em que não havia concertos, manhã cedo saía de casa, máquina “à la minute”, ele dizia à la minuta, e arrancava para as praias, para as feiras nos arredores, para tirar fotos de “olhó passarinho”.

Dizia à minha avó que assim fazia um dinheirinho para compor o curto ordenado de funcionário da Câmara. Mas isso, era apenas um pedaço de treta, tirava, quando tirava, uma ou duas, ou três fotos, o resto era copos e convívio com os amigos. Pelava-se por polvo seco assado na brasa, na Feira da Luz, ou na das Mercês, e é fácil imaginá-lo naqueles restaurantes de feira, mesas com toalhas de plástico, petiscos, jarros de barro com tintol e fora, a máquina, em cima do tripé, a olhar para ele, ou vice-versa.




Claro que nos domingos de concerto, também saía manhã cedo, mais petisco, mais copitos, o chegara casa, ao cair da noite, e a ouvir a minha avó: “maior fosse o dia maior era a romaria”.

Reformado da Câmara, já com pouca estaleca para transportar a la minuta, conseguiu alvará de guarda de automóveis num espaço junto à Sé de Lisboa.  Um fino humor, uma figura garbosa, davam-lhe o toque de charme que cativa damas e cavalheiros das missas de domingo, das missas de fim de tarde, e as gorjetas eram cantantes.

Fumava dois maços de "Definitivos" por dia. Copos e tabaco, outras coisas, provocaram-lhe graves problemas de circulação, ao ponto de lhe terem amputado as pernas.

O médico proibira-lhe os cigarros, o copito.
Assim, um pouco sem jeito, ia-lhe lembrando esses cuidados ,e o avô andarilho que foi, acamado que estava, a dizer-me:  “é pá! A vida são dois dias e o qué que queres que p’raqui esteja a fazer?




Nunca hei-de esquecer o prazer com que puxava cada fumaça de “Definitivos”.

As consoadas eram preenchidas com anedotas que, invariavelmente, repetia todos os anos. Recordo esta:

Um homem entra pela drogaria a pedir uma esmola para o ceguinho
.
- Mas  onde está o ceguinho?  pergunta uma cliente

- Está  lá fora a ver a montra!

Pelos cigarros, pelo copito, terá morrido mais cedo… mas morre-se por tantos motivos…

Foi “A Voz do Operário” que, gratuitamente, tratou do funeral.

Já não lembro o que aconteceu à máquina à la minuta e ao boné com a placa de guarda de automóveis

Do meu avô apenas guardo um relógio de pulso de marca “Invicta” e este cartão de “A Voz do Operário”.

Sou o único da família, que saiu com os olhos azuis do meu Afonso.


Legenda: a imagem do fotógrafo “à la minuta” foi tirada  daqui.
A outra imagem, mostra o espaço, junto à Sé, onde o meu avô foi guarda-de-automóveis.      

OLHARES


Durante a crise de 1879 um jornal não quis publicar uma notícia sobre as condições de vida dos operários tabaqueiros.
Custódio Gomes, operário tabaqueiro, indignado com a recusa de publicação da referida notícia terá afirmado: “soubesse eu escrever que não estava com demoras. Já há muito que tínhamos um jornal. Bem ou mal, o que lá se disser é o que é verdade. Amanhã reúne a nossa Associação, e hei-de propor que se publique um periódico, que nos defenda a todos, e mesmo aos companheiros de outras classes”.

A 11 de Outubro de 1879 nasceu o jornal “A Voz do Operário” e a 13 de Fevereiro é criada a Sociedade Cooperativa A Voz do Operário destinada a manter financeiramente o jornal, “órgão dos manipuladores de tabaco desligado de qualquer partido ou grupo político”.
Por solicitação dos associados, em Julho de 1883, a actividade da Sociedade foi alargada à assistência funerária, correspondendo a uma necessidade da classe, que se via confrontada com o exorbitante preço dos funerais. “Um jornal e uma carreta funerária, assim começa A Voz do Operário”, escreveu Fernando Piteira Santos.

Em 1932 a Sociedade tinha cerca de 70 mil sócios e era já o mais importante núcleo de instrução primária da cidade de Lisboa, com escolas a funcionarem também na periferia. Em 1938, as escolas de A Voz do Operário são frequentadas por 4.200 alunos, na grande maioria filhos de operários.

Durante a ditadura de Salazar/Caetano, “A Voz do operário “ foi baluarte, político e cultural, grão de arei na engrenagem que permitiu margens de manobra  e combate contra o obscurantismo e, as perseguições políticas, a censura.
Aquelas paredes, também guardam sementes do 25 de Abril.

VAGUEANDO PELA CIDADE


Ficar assim… frente a qualquer coisa… que pode ser uma moldura sem espelho, sem pintura, mas que através da qual se podem ver árvores, um candeeiro, no jardim do Campo de Santa Clara, em dia de Feira da Ladra.

E se lhe dissessem que os lugares vazios podem ter pessoas?

Legenda: fotografia de Aida Santos.

quarta-feira, 28 de setembro de 2011

JANELA DO DIA


Em entrevista à TVI o Presidente da República veio dizer aos portugueses que o próximo ano vai ser difícil, vai ser um ano de resistência.

"Mas, gostaria também muito que fosse um ano em que os portugueses vissem um rumo de futuro com alguma esperança".

Também disse que pensa convocar o Conselho de Estado para ouvir os conselheiros sobre a “incidência da situação política, económica e financeira.”

Cavaco Silva é um homem sem ideias. Porque ter ideias é um perigo e as pessoas como Cvaco têm medo dos perigos e, inevitavelmente, das ideias.

Em 19 de Abril de 1991, Paulo Portas escrevia em “O Independente”.
“Resumindo e concluindo, se a direita der outra vez a maioria absoluta a Cavaco Silva, será a primeira vítima dele, suportará o doutor Cavaco para lá do milénio e renunciará à política, a menos que se inscreva nessa União Nacional.. Quem quiser o país assim, vote nele. Depois não se queixe."

Legenda: imagem tirada do "Diário de Notícias"

É PERMITIDO AFIXAR ANÚNCIOS


 – Como é? Perguntou Luísa erguendo o copo.
   - Não é com o copo! Horror! Ninguém que se preze bebe champanhe por um copo. O     
     Copo é bom para o Colares…
Tomou um gole de champanhe, e num beijo passou-o para a boca dela. Luísa riu muito,  achou “divino”, quis beber mais assim. Ia-se fazendo vermelha, o olhar luzia-lhe.

Eça de Queiroz em O Primo Basílio     

POSTAIS EM SELO


Os domingos deprimiam-no, mas ficava feliz com as sextas-feiras.

Legenda: pintura de George Seurat

BB


Por ela, o mundo girou mais rápido; por ela, SaintTropez é o que é, e um dia passei por lá a correr e digo que aquilo não é nada; por ela, o biquíni, mundo fora, invadiu praias e piscinas; por ela, Roger Vadim explicou, em filme, porque Deus criou a mulher; por ela. Serge Gainsbourg, que um dia, disse “Nunca enganei ninguém, a não ser os que estavam errados acerca de mim”, compôs “Je t’aime… moi non plus”, uma canção para ser ouvida pelos tempos fora; por ela, em 1970, o escultor francês Alain Gourdon usou-a como modelo para o busto de Marianne, o emblema nacional da França; por ela, John Lennon e Paul McCartney fizeram planos para um filme; por ela Bob Dylan compôs a sua primeira canção, Dylan que, perguntado por John Kennedy, o que era necessário para a América crescer, respondeu: “Dear John: Brigitte Bardot e Sophia Loren”.
Misto de leviandade e, provável ingenuidade, por tanta coisa, marcou o final dos anos 50, mas nunca como actriz de cinema, muito menos como cançonetista.

Hoje, após outras visitas, está casada com Bernard d’Ormale, ex-conselheiro político do extremista-de-direita-qause-nazi, Jean-Marie Le Pen, defende os animais, mas insurge-se contra os imigrantes islamitas que vivem no país e tece duras críticas e ofensas aos homossexuais.

Numa canção, do brasileiro Zeca Baleiro pode ouvir-se:

“ a saudade / é um trem de metrô
subterrâneo obscuro / escuro claro
é um trem de metrô / a saudade
é prego parafuso / quanto mais aperta
tanto mais difícil arrancar
a saudade / é um filme sem cor /
que meu coração quer ver colorido
a saudade / é uma colcha velha
que cobriu um dia / numa noite fria
nosso amor em brasa / a saudade
é Brigitte Bardot / acenando com a mão
num filme muito antigo.”


Legenda: BB e Serge Gainsbourg, nos anos de brasa, à saída de uma festa.

terça-feira, 27 de setembro de 2011

IDÍLIO EM BICICLETA



“De lago em lago, de curva em curva, de suave subida em aprazível descida; de fotografia em fotografia, de aceno em buzinadela dos escassos transeuntes, da “Internacional” para a “Grândola”, da Violeta Parra para a Chavela Vargas, deixava-me flutuar, deslizar, inebriar; sair do tempo, do espaço, do corpo; e regressar com mais intensidade e prazer à exacta porção de espaço e tempo em que me encontro em cada momento.”

Texto e imagens de Idílio Freire

VAGUEANDO PELA CIDADE



Marie Thérese, médica belga, veio para Lisboa trabalhar, e quando conheceu a cidade, disse para dentro de si, que teria de morar num sítio onde passasse o eléctrico“28”.

Acabou por encontrar casa na Graça.

Vulgarmente não damos por isso, mas as felicidades fazem-se destas pequenas coisas…

POSTAIS EM SELO


“Ó Pedro, que é do livro de capa verde que te deu o avô?”

João de Deus, em “Cartilha Maternal”

Legenda: pintura de Jacek Yerka.

OS CLÁSSICOS DO MEU PAI



Sempre gostei de Dean Martin, o velho Dino, mesmo quando fazia de canastrão nos filmes com o Jerry Lewis.

Terei comprado este “EP” por volta de 1968.

Para além de “Chapel In The Moonlight, Little Ole Wine Drinker, Me, The Green, Green Grass of Home”, tem “Release Me”.

O meu pai adorava esta canção.
 Não há vez alguma que a Aida a ouça, que de imediato não se lembre do meu pai.

Era um excelente contador de histórias e, nas sessões de audição de música, dita ligeira, aproveitava para as contar.

Umas verídicas, outras imaginadas, outras, enfim, não se sabe bem como.

Esta é uma dessas histórias:

O velho morrera.

A família reunida na biblioteca, ouviu o advogado enumerar a relação dos bens legados.
À medida que a leitura avançava a boca dos familiares ia tomando a aforma e o tamanho de um enorme “Ah!”

-  papel e canetas para os que nunca lhe escreveram;

- tesouras de poda e mangueiras de rega para os que sempre desprezaram as suas rosas e   
  orquídeas;

- fósforos, cinzeiros e caixas de charutos para os que se irritavam e ficavam agoniados
  cada vez que puxava de um dos seus esplêndidos “Cohiba”;

 - o resto, que era tudo, para a governanta que lhe servia conhaque nas noites de Inverno.

segunda-feira, 26 de setembro de 2011

JANELA DO DIA


Na semana passada, o arquitecto Paulo Mendes da Rocha, apresentou o projecto do Museu dos Coches que, em Belém, está em fase de construção.

O projecto de revitalização do Museu dos Coches custará (para já, dado que só será inaugurado em Setembro do ano que vem e, sabe-se, as derrapagens que as obras públicas sofrem) 32 milhões de euros.

Em artigo de opinião, publicado no “Público”, intitulado, “Foi você que pediu uma garagem para coches antigos?”, o historiador de Arquitectura, António Sérgio Rosa de Carvalho, pode ler-se:

“Num processo apressado, sem concurso público, decidido por um ministro pouco económico (mais do que três dezenas de milhões) determinado a deixar marca de regime através da afirmação pelo contraste e ruptura, este projecto deixa-nos preocupado.

Acima de tudo porque é um símbolo de um despesismo inconsciente e irresponsável, destruidor de um equilíbrio perfeito já existente e criador de novas despesas num futuro muito incerto de penúria e crise no universo do património cultural e museus. (…)

O projecto lembra-nos um modelo de garagem com rampas, saído de uma miniatura do nosso quarto de brincadeiras, ou um espaço caricatural de um filme de Jacques Tati.”

IDÍLIO EM BICICLETA





“Uma manhã inesquecível, em que dá vontade mandar parar o tempo e eternizar o instante.”

Texto e imagens de Idílio Freire

SARAMAGUEANDO


José Saramago na conversa que manteve com João Céu Silva, disse:

“Não sei o que poderá acontecer amanhã mas não me vejo a voltar a escrever poesia. A minha poesia é uma poesia de segunda ou terceira classe não vale a pena teimar. Não tive ilusões, é o que é, limpa, honesta e em algum momento terá sido algo mais do que isso mas, enfim, não vou ficar na história como poeta. Suponho que se ficar na história será como um romancista que também fez alguns versos”

João Céu e Silva, a propósito desta afirmação de José Saramago, cita uma entrevista publicada em “O Tempo” de 7 de Dezembro de 1984:

“Não acho realmente, que seja um bom poeta. E talvez tenha sido a consciência desse facto que me fez, a partir de certa altura, abandonar de facto a poesia. Ou melhor: talvez não tenha abandonado de facto a poesia. O que abandonei foi a actividade de fazer versos. E não penso voltar. Pela maior liberdade que a prosa me concede, pela maior possibilidade de prolongar a o próprio discurso, talvez haja muito mais poesia num romance meu do que toda aquela que eu seria capaz de inserir num livro de poemas.”

São três os livros de poesia que José Saramago nos deixou:

“Os Poemas Possíveis”, Provavelmente Alegria”, publicados, respectivamente em  1966 e 1970, e “O Ano de 1993”, publicado em 1975.
Até à sua 2ª edição, em 1987, com ilustrações de Graça Morais. este livro passou, um tanto ou quanto, despercebido.

Trata-se de uma ficção poética iniciada no dia 16 de Março de 1974 ,  quando fracassou o golpe militar das Caldas da Rainha, um mês e alguns dias antes do 25 de Abril, um dia em que nos sentimos mais mergulhados nas trevas de então, um esvoaçar de esperança que durou escassas horas, uma desilusão.

Todas as calamidades haviam caído sobre a tribo ao ponto de se falar na morte com esperança

Um pouco mais e o suicídio colectivo seria votado e decidido

Assim pela infinita planície as vozes inseguras se iam aos poucos calando como se a próxima paragem fosse a última e o soubessem” ( início do capítulo 20).

José Saramago sempre incluiu esta narrativa apocalíptica, há quem lhe chame fábula, sem virgulas, sem pontos finais, apenas capítulos, como sendo um livro de  “poesia”.

Este é o capítulo 30, o final:

Uma vez mais os lugares conhecidos os lugares de solidão e de morte os centímetros quadrados de tortura as cores do sangue até à sua final cor de terra

 Uma vez mais o infinito combate as batalhas aquelas que se ganharam e essas outras humildes perdidas e de que não se quer falar

 Uma vez mais os suspiros sobretudo os últimos e os primeiros e os que estão entre uns e outros uma vez mais o braço sobre o ombro e o corpo sobre o corpo

 Uma vez mais tudo o que uma vez foi ou muitas as pegadas de hoje na marca dos pés antigos uma vez mais a mão no gesto começado e interrompido e assim sucessivamente

 Uma vez mais a ida e o regresso e agora a esperada fadiga entre duas altas montanhas num chão de pedra onde a sempre de repente fica enquanto o corpo se dissolve no ar

 Assim o olhar apartado a própria sombra com olhos invisíveis e sorrir disso enquanto as pessoas perplexas procuram onde nada está

 E uma criança objectiva se aproxima e estende as mãos para a sombra que fragilmente retém o contorno ainda mas não já o cheiro do corpo sumido

 Uma vez mais enfim o mundo o mundo algumas coisas feitas contadas tantas não e sabê-lo

 Uma vez mais o impossível ficar ou a simples memória de ter sido

 Consoante se conclui de nada haver debaixo da sombra que a criança levanta como uma pele esfolada

MEMÓRIAS


9 de Maio de 1968.
Benfica 2 Juventus 0
Golos de Torres e Eusébio.
Por trás do bilhete só tenho a data, o resultado e quem marcou os golos.
Mas como para estas coisas aconselharam-me a consultar o “Almanaque do Benfica”, posso dizer que na 2ª mão o Benfica foi ganhar a Turim, e apurou-se para disputar a final com o Manchester United. O golo do Benfica foi metido pelo Eusébio.
A 29 de Maio realizava-se a final no Estádio de Wembley.
A tal final em que, após prolongamento, perdemos por 4 a 1.

É PERMITIDO AFIXAR ANÚNCIOS


A partir de hoje e até 7 de Novembro, Jorge Silva Melo, vai estar, todas as segundas-feiras, pelas 18h30, no Pequeno Auditório da Culturgest para dar quatro conferências subordinadas ao tema “Não Gosto”.

A entrada é gratuita.

Este é o programa:

26 de Setembro
Não gosto dos críticos, não gosto

10 de Outubro
Não gosto de programadores, não sei o que fazem

17 de Outubro
Não gosto de ministros, secretários, chefes de gabinete, vereadores, assessores, directores-gerais e em geral

7 de Novembro
Gosto de actores, ai de mim.

E este é o texto de apresentação, que Jorge Silva Melo escreveu:

Je suis snob
Boris Vian

Já lá vão mais de 50 anos a ver e, mais tarde, a fazer teatro. Desde Mar de Miguel Torga, pelo TEP (em 1960? 61?), encenação de António Pedro, com a minha depois amiga Dalila Rocha, no Teatro Variedades, até ao Não se brinca com o amor de Alfred de Musset (esse que se perguntou “Com que sonham as raparigas?”), que estreamos em Viseu, em Setembro de 2011. E já vi passar tanta coisa, críticos que surgiram, aterrorizaram as hostes durante nove meses e desapareceram ou se tornaram directores de televisões (sim, sim), amigos que foram ministros, ministros que se tornaram inimigos, programadores que não sei quem os inventou, directores de teatro, directores-gerais que encontro, frustrados, impotentes, reformados, tanta gente que andou pelas estreias (“hoje está cá fulano”, até se diz nos camarins, como se isso fosse determinante) e se foi indo embora. E que deixaram? Apetece-me lembrar-me dos seus percursos (alguns), das suas promessas, das suas derrotas, das suas ilusões, dos seus fracassos. E dizer que não gosto, não gosto mesmo nada, não gostei nem gosto. Não gosto dos críticos que temos (e dos que tivemos?), não gosto dos programadores-autores (que temos e teremos?), dos ministros, directores-gerais sempre nomeados que nem Sísifos e a refazer leis que nem Penélope eliminando pretendentes, não gosto. Não digo das pessoas, até há de quem gosto e gostarei: é das funções, do tempo que perdem, do tempo que fazem perder, do mundo que tapam. Por isso vou dizer tudo e espero que olhos nos olhos. E, porque gosto de happy-ends, dizer que gosto, gosto de actores, actrizes, técnicos.”

domingo, 25 de setembro de 2011

IDÍLIO EM BICICLETA


“Estrada pela eternidade…”

Texto e imagem de Idílio Freire

MATINÉ DAS 3

Amor Sem Barreiras.
Romeu e Julieta num musical que é um filme que nunca se esquece.
O drama, as danças, as músicas, as canções.
Realização: Robert Wise e Jerome Robbins (1961)
Com Natalie Wood, Richard Beymer, Russ Tamblyn, Rita Moreno, George Chakiris.
Música de Leonard Bernstein.

OS CROMOS DO BOTECO

OLHARES


A cidade tem destas mensagens deixadas pelas paredes.

No portão de uma velha oficina, na Rua da Manuetenção, ali para os lados de Xabregas pode ler-se:

“O chamapnhe da 111 é melhor”

Por champanhe pensa-se em “Don Perignon”, em “Moet ; Chandon” os da “Pierre-
Jouet”, coisas assim, mas agora, alguém escreveu numa parede da cidade que o melhor champanhe é o da 111.

Faltam elementos para perceber a mensagem.

A “111” será a galeria?

E vendem lá champanhe? .

Não por nacionalismo pacóvio ou patrioteiro embandeirado,  ou a mania que percebo disto a potes, prefiro os nossos espumantes ao champanhe, apenas uma questão de gosto, no more.

Mas prontos, ficamos com esta:

“O champanhe da 111 é melhor!”

O QU'É QUE VAI NO PIOLHO?


“comprei um bilhete e um cartucho de amendoins e
entrei no cinema. tu compraste um bilhete e um
cartucho de amendoins e entraste no cinema, sen
támo-nos na mesma fila, lado a lado. eu abri o meu
cartucho de amendoins, tu abriste o teu cartucho
de amendoins, com um ruído exactamente igual ao
meu. voltei-me para ti e mostrei os dentes. tu
voltaste-te para mim e mostraste os dentes. quan
do a luz apagou, tu pousaste o teu cartucho de a
mendoins no colo e eu pousei o meu cartucho de
amendoins no colo. com a mão direita comecei a le
vantar-te a saia. para me facilitar a tarefa, tu
levantaste levemente as nádegas do assento. com
esse gesto, caiu-te do colo o cartucho de amendo
ins. assim que os amendoins acabaram de se espal
har no chão, abaixei-me para tos apanhar, mas es
queci-me do meu cartucho de amendoins, o qual me
caiu igualmente ao chão. gastei um tempo enorme
a procurar e a recolher todos os amendoins. lembro
me de que passei o tempo quase todo até ao inter
valo recolhendo amendoins. todo o tempo tu
não deixaste de suspirar e de gemer, embora esti
vesse apenas a decorrer um documentário sobre
o narciso e nenhum drama comovente. a voz do lo
cutor lembro-me que dizia: «no começo da primave
ra, quando montes e vales acordam do longo sono
de inverno, centenas e centenas de narcisos ele
vam as douradas cabeças em todas as frestas e a
brigos do solo, e lançam seu olhar inocente pelos
portentosos rochedos e pelas raízes nodosas da
floresta.» isto, como certamente te lembras, foi
antes do intervalo. depois, quantas vezes, oh quan
tas vezes não deixaste cair e eu não deixei cair
os amendoins que nos restavam. e ora eu, ora tu,
de cada vez descíamos a procurá-los, e a colhê-los
com suaves, ternos guinchos. o filme, no dizer da
crítica, era daqueles que se não podem perder.”

Alberto Pimenta em  “Poemas Com Cinema”, antologia organizada por Joana Matos Frias, Luís Miguel Queiroz, Rosa Maria Martelo, Assírio &Alvim, Novembro 2010

sábado, 24 de setembro de 2011

IDÍLIO EM BICICLETA


“Para sair de Bariloche em direcção ao sul, tive de transpor uma curta mas acentuada subida. E o que receava acontecia: com o piso enlameado pela neve, a aderência era baixa, a tracção mínima e a segurança quase nula. Para mim, era o teste que esperava mais tarde ou mais cedo. Não sentir os pés nem as mãos, congelados; percepcionar o nariz e as orelhas como blocos de gelo; lacrimejar e sentir o nariz gotejar – não sei bem o quê – não me preocupavam. Mas a ciclística, sim, preocupava-me e não tinha qualquer alternativa. Felizmente a subida era curta, os condutores irrepreensíveis – excepto um ou outro que me encharcou com a neve que projectou – e, passada a zona urbana, o trânsito diminuto.”

Texto e imagem de Idílio Freire