sexta-feira, 23 de setembro de 2011

PABLO NERUDA



Neste dia, no ano de 1973, com 69 anos, morria o poeta militante chileno Pablo Neruda.

Este ano, aliás, foi terrível para os grandes Pablos: a 8 de Abril morria Pablo Picasso, a 22 de Outubro, Pablo Casals.

Neruda debatia-se, há alguns anos, com um cancro na próstata, mas o golpe militar que derrubou, com o total apoio dos Estados, Unidos, o governo de Salvador Allende, apressou o fim.

Doze dias antes da sua morte, uma feroz ditadura militar, comandada por Augusto Pinochet, instalou o terror e a morte no Chile.

“Uma vitória é sempre um calafrio,
Porque se ganha o povo há uma corrente de ar
Na tonta do invejoso logo a entrar” (1)

Milhares e milhares de mortos e feridos, assassinados, massacrados, de desaparecidos, de refugiados,

Pinochet morreu em Dezembro de 2006, sem nunca ter sido julgado pelos hediondos crimes.

Em Julho de 2010, para comemorar o bicentenário da independência do Chile, a Conferência Episcopal chilena pediu, ao Presidente da República Sebastián Piñera, perdão para Augusto Pinochet e os militares condenados por crimes cometidos durante a ditadura.

Abençoada gente!...

Neruda era apelido do Chile.

Quando um chileno viajava por outros países e lhe era perguntado donde vinha, respondia: “Chile”, e acrescentava: “Neruda”.

“Iluminou através da sua poesia valores humanos caros ao humanismo marxista, enchendo de uma nova luz as coisas mais simples; recuperou para o universo poético cebolas, formas de amar, maneiras de lutar, aromas, gestos de povo; encheu a esperança de coisas e as coisas de esperança; deu forma humana ao Chile, converteu em novas, velhas frases, tornou o surreal real e o real e o real maravilhoso e ofereceu um grande e livre reino de palavras a todos os poetas. Morreu com o coração em forma de Povo em nome de um Povo que já o tinha a ele no coração.”
(2)




Em Outubro de 1971, a Academia Sueca atribui-lhe o Prémio Nobel da Literatura:

“O meu Prémio Nobel tem uma longa história. Durante muitos anos, o meu nome foi apontado como candidato sem o mínimo resultado.
Em 1963, a coisa foi mais séria. As emissoras disseram e repetiram várias vezes que o meu nome era firmemente discutido em Estocolmo e que era o mais provável vencedor entre os candidatos ao prémio. Matilde eu pusemos então em prática o plano nº 3 de defesa doméstica, Colocámos um cadeado grande no velho portão da Ilha Negra e abastecemo-nos de comida e vinho tinto. E escolhi alguns romances policiais na perspectiva do meu enclausuramento.
“A verdade é que qualquer escritor deste planeta chamado Terra deseja um dia alcançar o Prémio Nobel, incluindo aqueles que o não confessam e também aqueles que o negam.” (3)

Filho de ferroviário era um homem simples, de uma sensibilidade assombrosa que fugia das intelectualidades e apresentava-se, geralmente, com um boné aos quadrados e um casaco atirado para os ombros.

Numa carta que escreveu a John Edwards, pedia-lhe que fosse a Londres comprar-lhe um par de tambores que tinha visto numa loja, na sua passagem pela capital inglesa. A vida não se consegue viver sem um tambor. Nas manhãs da Ilha Negra tocava clarim e, com um gorro de marinheiro na cabeça, içava no mastro da praia a sua bandeira que era um peixe.

“A minha bandeira é azul e tem um peixe horizontal fechado ou enquadrado por dois círculos armilares. No inverno, com muito vento e sem ninguém por estes caminhos abandonados, agrada-me ouvir o agitar da bandeira e ver o peixe nadar pelos céus como se estivesse vivo.” (4).

Em 1970, pelo Partido Comunista Chileno, foi candidato ao cargo de Presidente da República. Durante a campanha eleitoral, percorreu o país de uma ponta à outra, inflamando multidões com discursos poéticos que falavam ao coração e ao sentir do seu povo, seguindo uma lição de vida que lhe apontava o caminho de que o segredo está no modo como olhamos as coisas e as pessoas.
O Partido, em benefício de uma candidatura mais abrangente, pediu-lhe que retirasse a candidatura para que fosse possível apoiar Salvador Allende.

Neruda não hesitou um segundo – o seu país, o povo chileno estavam à frente de tudo o mais.

Em Maio de 1971, Salvador Allende tornou-se o primeiro presidente da República marxista, democraticamente eleito, na América Latina.

“Não tenho cura: contra os inimigos do meu povo a minha canção ´«e ofensiva e dura como pedra araucana.

Pode ser esta uma função efémera, mas cumpro-a. E recorro às armas mais antigas da poesia, ao canto e aos panfletos usados por clássicos e românticos e destinados à destruição do inimigo.

Agora firmes, que vou disparar” (5).



(1)  e  (5) - "Incitamento ao Nixonnicídio e Louvor da Revolução Chilena, O Testamento poético de Pablo Neruda", Agência Portuguesa de Revistas, Lisboa, Dezembro de 1975

(2) - Eduardo Valente da Fonseca, Suplento Literário do "República", 27 de Setembro de 1975

(3) - "Confesso Que Vivi", Pablo Neruda, Publicações Europa-América, Lisboa Bril 1975

(4) - "Uma Casa na Paria", Pablo Neruda, Edições Contraponto, , Lisboa, Novembro 1996

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