domingo, 31 de março de 2013

SARAMAGUEANDO


Ainda não são três horas quando chega ao Alto de Santa Catarina. As palmeiras parecem transidas pela aragem que vem do largo, mas as rígidas lanças das palmas mal se mexem. Não consegue Ricardo rei lembrar-se se já aqui estavam estas árvores há dezasseis, quando partiu para o Brasil. O que de certeza não estava era este grande bloco de pedra, toscamente desbastado, que visto assim parece um mero afloramento de rocha, e afinal é monumento, o furioso Adamastor, se neste sítio o instalaram não deve ser longe o cabo da Boa Esperança. Lá em baixo, no rio, vogam fragatas, um rebocador arrasta atrás de si dois batelões, os navios de guerra estão amarrados às boias, com a proa apontada à barra, sinal de que a maré está a encher.

José Saramago em O Ano da Morte de Ricardo Reis.

DOMINGO DE PÁSCOA


Os tempos de crise.
Lá fora uma tempestade desfeita.
Não é muito apropriado desejar um Bom Domingo de Páscoa.
Dizer apenas que continuo a gostar dos procedimentos, das palavras do Papa Francisco.

Aceita que Jesus Ressuscitado entre na tua vida, acolhe-O como amigo, com confiança: Ele é a vida! Se até agora estiveste longe d’Ele, basta que faças um pequeno passo e Ele te acolherá de braços abertos. Se és indiferente, aceita arriscar: não ficarás desiludido. Se te parece difícil segui-Lo, não tenhas medo, entrega-te a Ele, podes estar seguro de que Ele está perto de ti, está contigo e dar-te-á a paz que procuras e a força para viver como Ele quer.
Paz para o mundo inteiro, ainda tão dividido pela ganância de quem procura lucros fáceis, ferido pelo egoísmo que ameaça a vida humana e a família – um egoísmo que faz continuar o tráfico de pessoas, a escravatura mais extensa neste século XXI.

POSTAIS SEM SELO


A minha mulher cozinha todas as noites e eu ajudo-a a lavar a loiça.

Alfred Hitchcock

Legenda: Hitchcock e Alma Reville, sua mulher e luminosa colaboradora.

sábado, 30 de março de 2013

NOTÍCIAS DO CIRCO


O ANTIGO PRIMEIRO-MINISTRO, José Sócrates, a estudar filosofia em Paris desde que deixou o Governo, em Abril  vai regressar a Portugal para participar, como comentador, num programa semanal da RTP, com a duração de 25 minutos, transmitido em horário nobre, a seguir ao telejornal da noite.

Entretanto, na quarta-feira, na entrevista na RTP, mesmo que veladamente, disse ao que vinha e de, repente, a agenda política ficou dominada pelo que (não) disse.

Trecho de uma crónica de Ferreira Fernandes no Diário de Notícias:

A tecla batida do regresso do animal feroz. foi moderado, criticou no PR falhas de solidariedade institucional. Ora com Cavaco um animal feroz levantaria outra coisa: aquele que é hoje o Presidente de Portugal ganhou de um banco, num ano, mais do dobro do que lá tinha depositado - e, depois de ter sido provado que o banco era de bandidos, não devolveu as mais-valias. Essa é a questão-chave, porque reconhecida e aceite, do desconforto dos portugueses com os seus políticos. Já com os chefes do Governo e da oposição, Sócrates limitou-se a mostrar, em contraexemplo, que Passos tem sido uma cucurbitácea, lá fora, e Seguro, um banana, cá dentro. Daí as minhas críticas por ele ir para essa coisa falsa que é político comentador político. Um político assim deveria ir ao congresso do seu partido e lutar pelo seu lugar.


Coloquemos de lado a liberdade que cada uma tem em exprimir as suas opiniões, os direitos cívicos, o que quiserem, e diga-se que foi curto o tempo de nojo socrático, que poderia continuar em Paris, que o país, neste momento, ou para sempre, não necessita da sua participação.

O mundo do comentário televisivo está a rebentar pelas costuras de ex-ministros-de ex-tudo-e-mais-alguma-coisa, um desfile de uma enorme falta de vergonha na cara, um exagero, uma inutilidade e, desculpem lá, uma qualquer coisa que não bate certo, qualquer coisa que me coloca no limiar do vómito.

O DESAPONTAMENTO DE GASPAR: afinal há mais 316 mil desempregados.

No final da conferência de imprensa um jornalista quis saber a importância que tinha tido a recessão europeia na tolerância dada a Portugal com o prolongamento do défice. Gaspar respondeu: Para ser simples, não sei.

A frivolidade a tocar as raias da incompetência… ou da loucura…


ESCREVEU JOSÉ PACHECO PEREIRA no Abrupto:


Cada vez que há um novo pacote de austeridade, o governo falha os seus objectivos.

Enquanto não sairmos deste círculo vicioso, daqui não saímos.


No fundo, é simples.


TALVEZ ESTEJA ESCRITO NAS ESTRELAS: A Europa que aí vem será a Europa que a Alemanha quiser, como quiser e quando quiser…


O MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO confirmou à Lusa que recebeu da universidade Lusófona um relatório sobre a licenciatura do ministro dos Assuntos Parlamentares, Miguel Relvas, tendo fonte oficial adiantado que terá, em breve, surgirão novidades.


MARCADORES DE LIVROS


QUOTIDIANOS



Definitivamente não sei explicar mas, em tempo de Semana Santa, vêm-me sempre, mas sempre, à memória duas ou três coisas:

A parede do antigo Cinema Lys, a que estava voltada para a Avenida Almirante Reis, com os grandes cartazes de A Túnica de Henry Koster com o Richard Burton, a Jean Simmons, o Victor Mature.

A Emissora Nacional a interromper o silêncio radiofónico para transmitir os jogos de Hóquei em Patins do Torneio deMontreux.

O Carlos Alberto que aparecia de gravata preta.

Os putos da rua que éramos, perguntavam sempre do porquê, e a resposta também a sabíamos:

- Cristo morreu!

A minha avó apenas respeitava a quinta e a sexta-feira santas  e nesses dias não havia carne para ninguém.

Curiosamente, também não abundava nos outros dias.

 Porque o pequeno mundo caseiro vivia do rol fiado do merceeiro, Francisco de seu nome, estabelecimento na esquina da Castelo Branco Saraiva com a Vila Gadanho.

O QU'É QUE VAI NO PIOLHO?


Não vi todos os filmes de Alfred hitccock.

O ciclo sobre Hitchcock que, durante o mês de Março, a Cinemateca esteve a exibir, serviu para recticar algumas lacunas.

Levei algum tempo a perceber, e a gostar, de Hitchcock.

Cada um tem os seus gostos, os seus olhares, mas se tivesse que mencionar os meus cinco filmes preferidos de Httchcock, a lista ficava assim:

A Janela Indiscreta
Vertigo
39 Degraus
O Homem Que Sabia Demais
Os Pássaros.

Quando François Truffaut esteve largamente, muito largamente, à conversa com Alfred Hitchcock, disse-lhe que de todos os seus filmes, os preferidos eram Difamação e Janela Indiscreta.


Devido a um acidente, um repórter fotógrafo L. B. Jeffries (James Stewart) ficou imobilizado no seu apartamento, com uma perna engessada. Como entretenimento para as horas que passam, observa os comportamentos dos vizinhos do prédio em frente: uma solteira desesperada por companhia, um músico que tenta encontrar a inspiração nas bebidas alcoólicas, um casal que mima o cão como se fosse um filho… isto até ao momento em que a observação de Jeff o leva a suspeitar que um crime foi cometido no prédio e o fotógrafo decide envolver a sua noiva (Grace Kelly) e um detective amigo (Wendell Corey) numa perigosa investigação. A evolução dos acontecimentos dá-lhe razão e, por fim, o assassino (Raymond Burr) atravessa o pátio e atira pela janela o nosso repórter que escapa… com a outra perna partida.

O filme é um apanhado de pequenas histórias que se desenrolam no pequeno mundo das traseiras de um prédio.

James Stewart  era um voyerur.  Lembro-me (Hitchcock a falar com Truffaut) de uma crítica a propósito. A menina Lejeune escreveu no London Observer que Rear Window era um filme «horrível» porque havia um tipo a olhar constantemente pela janela. Penso que ela não deveria ter escrito que era horrível. Sim, o homem era um voyeur, mas não seremos todos voyeurs?


Garanto-lhe que nove em cada dez pessoas, se virem do lado de lá do pátio uma mulher a despir-se antes de se deitar ou simplesmente um homem a arrumar o quarto, não conseguem evitar o olhar. Poderiam desviar o olhar, dizendo: »Isto não é não me diz respeito»; poderiam fechar as persianas, mas, ora! Não fazem nada disso, ficam a olhar.


O cinema está repleto de brilhantes e comovedoras cenas de beijos. 

As cenas finais do Cinema Paraíso, de Giuseppe Tornatore, são uma montagem feita a partir dos cortes de cenas de beijos, e outras, que o padre, censor-mor-da-comunidade, determinava, depois de, sem sombra de pecado, se ter regalado a ver tudo.

Há quem diga que os beijos que Grace Kelly, o vulcão debaixo de gelo, como lhe chamava Hitchcock, troca com James Stewart neste filme,  são dos mais belos  da história do cinema. François Truffaut, se não o afirma categoricamente, está perto disso. João Bénard da Costa pensa que o mais belo será entre John Wayne e Maureen O´Hara em O Homem Tranquilo. 

Estas coisas valem o que valem… pelo que, sem qualquer classificação beijocal, apenas direi que são grandes momentos de cinema.

 A primeira aparição de Grace Kelly, no apartamento de James Stewart ,dá-se sem nós a vermos, apenas a sua sombra vai-se desenhando na face de James Stewart que está sentado, a dormitar, na cadeira de rodas.

 Entretanto acorda e beijam-se. 


A outra cena é quase no final do filme. 


James Stewart, para fugir ao criminoso estatela-se no pátio e parte a outra perna. Deitado no chão vê o rosto de Grace Kelly aproximar-se do seu.seu. Ela não o beija, mas uma madeixa de cabelo vai caindo lenta e suavemente sobre o rosto de Stewart.


É agora o tempo de vos apresentar dois diálogos do filme.


Logo a abrir, o longo diálogo entre a enfermeira e James Stewart, é um primor de graça.  Na troca de palavras, vindo a talhe de foice a inteligência, a enfermeira diz-lhe: 

Inteligência: Nada tem causado tanto sarilho à raça humana!

O outro diálogo ocorre durante uma das conversas entre Jeff e Lisa, quando esta faz desesperadas tentativas para provocar o casamento com Jeff, que não  está muito virado para isso:

Lisa – Gostava de ser criativa!

Jeff – Mas tu és minha querida! Tens um grande talento para criar situações difíceis!

Lisa – Achas?

Jeff – Claro! Como passar a noite aqui sem seres convidada.

Lisa – A surpresa é o mais importante elemento do ataque.

Do texto da Cinemateca:

Pode chamar-se-lhe um «filme de câmara». A notável articulação entre os espaços do interior do apartamento de Stewart e o pátio e as traseiras dos vizinhos é o resultado de
Um dos mais fabulosos trabalhos de designing da história do cinema. 

sexta-feira, 29 de março de 2013

OS CROMOS DO BOTECO


OLHAR AS CAPAS



O Cachecol do Artista

Luiz Pacheco
Contraponto, Lisboa Janeiro 1965

Meditei doze meses neste problema. E a conclusão é que só me resta apelar, apelar sempre, esconder a careca e a vergonha (que haja) e estender a pata. Apelar par o Ministro e para o Secretário. Apelar para o Leal! e para ao amigos, os Mecenas, os Vizinhos, os Desconhecidos.

                      O ARTISTA PRECISA DE UM CACHECOL!

Pode ser que conheças, Leitor, qualquer artista na necessidade: não o desampares, muito especialmente por estes dias de Inverno. E não conhecendo, e querendo, não faças cerimónia: manda o que puderes.
Aceitamos tudo:
Dinheiro, cigarros, fatiota, roupas de cama, mercearias, BACALHAU, brinquedos, livros esferográficas, papel de máquina, vitaminas, uma corneta (para eu tocar num dia que cá sei), viagens pelo Continente, estadias em casas de muito sossego, garrafas de vinho, revistas com nus (são para mim), um casaco de abafar (é para a minha senhora), bolas de Berlim, salsichas, passas e nozes, tâmaras, um osso com tutano para o caldo da Géninha, lâminas de barba, o perdão das nossas dívidas, uma assinatura do Jornal de Letras e Artes (minha leitura predilecta, bolo-rei, bolsa da Gulbenkian (proposta: uma biografia do Bocage), uma caixa de bombons, passarinhos assados, orelheira de porco, latas de conserva (gostamos de qualquer marca), etc., etc., etc,
                                                          O Artista agradecido
                                                                Luiz Pacheco

quinta-feira, 28 de março de 2013

DO BAÚ DOS POSTAIS


Lisboa.

quarta-feira, 27 de março de 2013

DE BARBAS E BIGODES


No seu nº 1854, 27 de Março de 1975, de A Vida Mundial, o jornalista Fernando Dacosta fazia uma síntese, a atirar para o humor, do pós actuação, incompetente e patética, de Spínola e sus muchachos, nos acontecimentos do 11 de Março:

Imagine-se Spínola de barbas e bigodes artificiais a atravessar, clandestinamente, uma fronteira qualquer em direcção à Espanha. Deve ter sido o que ele pensou ao decidir-se ao incluir na sua bagagem, às vésperas da intentona de 11 de Março, aqueles disfarces, agora recolhifos e que – é uma sugestão – naturalmente, devem ser conservados para um museu sobre o fascismo luso…

O lusitanismo-africanista do ex-general põe-no agora a comer mamões, no Brasil, “uma fruta que ele aprendeu a gostar em África” – disse um dos sesu acompanhantes, em São Paulo.

É um homem meticuloso – afirmava o seu antigo chefe de cerimonial em Belém.” – Chega mesmo a ir verificar, antes da chegada dos sues convidados, se a mesa do jantar está bem posta…”

…. Meticulosamente Spínola contou as armas de que precisava (granadas de mão, quatro metralhadoras e uma espingarda de assalto, uma pistola metralhadora, armas automáticas de origem soviética, várias pistolas e grande quantidade de munições) para se escapar até Espanha, a estas juntou duas malas e dois sacos de viagem, mais uma pasta de documentos e a mulher Dona Maria Helena, e, atrás de um helicanhão, abandonou Tancos, num helicóptero. Noutros três seguiram 16 oficiais, seus companheiros de intentona.

Numa das malas, roupas deles e da mulher, a farda de general com as condecorações, farda de cerimónia, uma outra de serviço, objectos de higiene, jóias e, num fundo falso, as barbas e bigodes postiços. Nada disso levou para o Brasil. Ficaram ainda, um bastão, o seu conhecido pingalim e os meios-óculos que punha ao ler os seus discursos na televisão. O monóculo foi com ele.

Os quatro helicópteros e todo este material regressaram a Tancos, na sexta-feira 21. Os militares da Base Aérea de Talavera la Real, onde Spínola ficou por quatro dias, devolveram aos oficiais e sargentos portugueses que foram recambiar os aparelhos, até mesmo os invólucros das balas deflagradas pelos golpistas.

Hoje, resta apenas um homem de monóculo, comedor de frango assado “a noisette”, com ervilhas e cenoura – o seu almoço antes de deixar São Paulo para residir no Rio…

Ah! E a certeza de que: ao comprar barbas e bigodes para servir de disfarce sabia muito bem no que estava metido e não foi para Tancos enganado como chegou a dizer…

VELHOS DISCOS


Mais uma visita os velhos discos comprados na Grande Feira do Disco. 
Depois dos tangos, dos passodobles,  não poderiam faltar as valsas.

terça-feira, 26 de março de 2013

ELEVADOR DE SANTA JUSTA


A justíssima ascensão
tem arcadas de zarção

Na noite de São João
relva queimada no chão

Luminárias de São Pedro:
madrugada, vinho azedo.

Pão a sair, aço novo
pintado da cor do povo.

Um castelo que alumia
os minaretes do dia.

E a graça que se vislumbra
do calcário da Rotunda.

As árvores da Avenida
lá em baixo, combalida
.
E o Eiffel que desde França
veio num rio de esperança

de maravilhar as agentes
cheias de Tejo e doentes

e ficou na corda estreita
de Santa Justa desfeita

por terramotos cansados
e horizontes espantados.

Sombra que se alonga este rio
nas pombas do meu Rossio.

José Carlos González em Lisboa e Outros Sapatos

segunda-feira, 25 de março de 2013

domingo, 24 de março de 2013

BENFICA 4 - TORINO 3


Não saber de todo o que se passara em redor deste jogo do Benfica.
Quando tudo isso aconteceu eu tinha quatro anos, mas mesmo assim, ao longo dos tempos, nunca ouvira falar do jogo em si e da tragédia que ocorreu no dia seguinte.
Um documentário muito bonito e, desculpem lá!, comovente até às lágrimas.

sábado, 23 de março de 2013

ÓSCAR LOPES (1917-2013)


Um sentimento unânime: com a morte de Óscar Lopes desapareceu um dos vultos maiores da cultura portuguesa do século XX.
Uma qualquer morte mata sempre um pouco a nossa memória.
Na minha primeira aula de Literatura do 6º ano, o professor, deu as boas-vindas e de imediato disse que quem quisesse saber, mas saber mesmo, qualquer coisa da matéria, havia que comprar -  e ler - a História da Literatura Portuguesa de António José Saraiva e Óscar Lopes.
Editada pela Porto Editora, o meu exemplar é a 3ª edição corrigida.
Em finais de 1969, comprei o meu primeiro livro, a solo, de Óscar Lopes: Ler e Depois.
Este livro representa um conjunto de tentativas no sentido da síntese agora possível, por parte, não de um investigador ou crítico literário profissional (há anos que nem sequer ensino literatura no Liceu), mas de um simples leitor que vai lendo e pensando, e depois continua pensando, sobre o que lê e é, a ponderar intuições, informações (aquelas que lhe chegam), estéticas, morais, práticas, científicas, políticas, umas com outras, e uma contra outras mesmo sem sair de cada um dos domínios de ser e do valer.
O livro tem dedicatória:
Recordação de Mário Sacramento, recordação de todos os momentos em que me saíu da boca a palavra «TU» num alvoroço de camaradagem ou de ternura.
Óscar Lopes ensinou-me a ler, porque ler, como disse alguém, não é apenas juntar as letras.
Militante do Partido Comunista desde 1944, perseguido pela ditadura, proibido de leccionar, contou que a sua avó chorou de desgosto quando soube que ele era comunista. "E eu chorei, porque ela chorou", foi alguém, tal como escreveu Baptidta-Bastos, maior do que o seu tempo.
Já ficou no Olhar as Capas o comovente e judicioso depoimento que Agustina Bessa Luís escreveu e que está incluído no livro comemorativo dos noventa anos de Óscar Lopes.
Mas, necessariamente, voltarei a Óscar Lopes.
Um Homem que, para além de muitas outras coisas, gostava de gatos e de flores.

Legenda: Óscar Lopes no jardim de sua casa, tirado do livro Óscar Lopes – um homem maior do que o seu tempo.

OLHAR AS CAPAS


Óscar Lopes – Um Homem do Seu Tempo

Diversos
Prefácio: Isabel Pires de Lima
Coordenação: José da Cruz Santos
Direcção Gráfica: Armando Alves
Edição Câmara Municipal de Matosinhos, Outubro de 2007

Devo a Óscar Lopes os primeiros conhecimentos sobra a crítica. A companhia que o crítico pode significar para o fugitivo da área familiar, em geral a que nos ensina primeiro a duvidar de tudo, foi para mim Óscar Lopes. Antes de A Sibila tomar lugar nas letras portuguesas, já ele se interessava pelos Contos Impopulares, melancólico salto sobre um abismo de lirismo desempregado. O crítico, como intérprete duma linguagaem, é o médium que o espírito convoca. É compreensível que o jovem autor comece por não gostar dos críticos e acabe por vê-los como sendo os médiuns próprios para desvendar a ideia.

Não sou muito adepta das homenagens que se prestam ao tempo vivido por um homem de talento. Todos os seus dias são dignos de louvor e os seus sacríficios estão mais presentes na juventude do que na idade avançada. Esta é o tempo em que devemos deixar dormir, mais do que pensar, as pessoas inteligentes. Se dormir é o cúmulo do génio, como disse um filósofo que eu muito prezo, então não despertemos com palavras barulhentas os que deixam uma obra para a posteridade.
Eu penso que o Óscar Lopes não pertence ao número daqueles que é preciso elogiar, como se faz às crianças para que elas nos obedeçam. Obedecer não é próprio dos homens. Porque devemos elogiá-los?

Por mim, eu digo que me aborreço quando me parecem consolar de alguma coisa com as honras que me prestam. Prefiro um café quente a um bom elogio. Mas nem todos são assim.

Fomos amigos em campos diversos mas não extremados. Óscar Lopes e eu. Convivemos ma mesma admiração pelos livros e na paixão das ideias. Eu, que sou avara de palavras faladas, porque o ciúme das escritas me arrasta para longe delas, no entanto, fora da minha vocação, vejo o talento de alguém e digo-lhe que é preciso ter coragem para ter talento. Aqui e em qualquer lugar. O talento briga com tudo, arranja inimigos em toda a parte porque tem que expandir a sua diferença onde quer que esteja. É por isso que as homenagens lhe cheiram a esturro. O gozo estético do talento é uma luta de morte com a própria celebridade. Ela parece sempre uma forma de fechar as contas e de partir noutra direcção, que não é a do talento, bem entendido.

As nossas contas ficam em aberto. Mais erradas do que certas. A vida é assim. Nós somos assim. Óscar Lopes e eu e muitos que têm a vocação como virtude curativa.

Porto, 1 de Junho de 1996
Agustina Bessa -Luís

QUOTIDIANOS


Com quem se iria encontrar a mulher japonesa, que emprego teria, o que faria na Europa, sem conhecer uma só das línguas indo-europeias, quem lhes escreveu o nome da cidade do destino. Mas sobretudo pensava se a carteira Louis Vouitton era verdadeira ou de contrafacção. Uma vez em que me surpreendera pela venda de imitações que me pareciam perfeitas, num mercado de rua em Roma, perguntei a L., uma elegante com quem costumo viajar, como é que se distinguiam os originais. Pela classe, respondeu-me ela. Nunca percebi esses pormenores que fazem a diferença. Passei a olhar as carteiras à procura da classe das mulheres e a olhar as mulheres em busca da classe da carteira. Esta questão parece fútil. Mas foi Curling, um escritor muito sério, quem disse que o comunismo caiu não porque os homens quisessem usar fatos, mas porque queriam usar fatos Armani.

Luis Januário em A Natureza do Mal.

sexta-feira, 22 de março de 2013

O QU'É QUE VAI NO PIOLHO?


A primeira, e única, vez que a minha mãe foi ao futebol, verificou-se no dia 3 de Maio de 1949.
Para a festa de homenagem a Francisco Ferreira, médio esquerdo e capitão do Benfica, o clube convidou a equipa italiana do Torino, na altura a melhor equipa do futebol italiano.
O jogo realizou-se no Estádio do Jamor e o Benfica venceu o Torino por quatro bolas a três. O meu avô e o meu pai acompanharam-na.
Durante muitos anos fui ouvindo falar desse jogo, daquela grande equipa, onde pontificava Mazzola, uma lenda do futebol italiano.
No dia 4 de Maio, pouco passava das cinco da tarde, o avião que transportava, de regresso,  a comitiva, devido ao mau tempo, chocou com a fachada da Basílica de Superga perto de Turim.
Não houve sobreviventes.
O meu avô e o meu pai fizeram parte dos milhares de benfiquistas, e não só, que se juntaram frente à Embaixada de Itália em Lisboa em sinal de luto e homenagem..
Nessa época, o Torino tinha quatro pontos de avanço sobre o Inter, faltavam quatro jornadas e oito pontos por disputar, mas a liga italiana, face à tragédia, declarou o Torino campeão .
 No próximo domingo, dia 24, pelas 15h15, na Sala Manoel de Oliveira do Cinema São Jorge, e integrado na 6ª edição da Festa do Cinema Italiano,vai ser exibido Benfica-Torino 4-3.
O filme, em formato de documentário, Benfica–Torino 4–3 é o resultado de uma outra cooperação luso-italiana que junta os realizadores Andrea Ragusa e Nuno Figueiredo, criadores da Figura Film, na sua primeira incursão pelo cinema. O documentário relata os acontecimentos vividos naqueles dias. As imagens de arquivo e os relatos na primeira pessoa, inclusivé de Rogério Lantres de Carvalho, conhecido por “Pipi”, autor do quarto golo do Benfica naquele dia, dão vida a uma história que pretende ser mais do que um relato de uma tragédia, uma homenagem às trinta e uma pessoas que perderam a vida naquele 4 de Maio de 1949
Benfica-Torino 4-3
4/5/1949, 2 equipas, 1 jogo, 7 golos, 1 avião
31 passageiros a bordo, 0 sobreviventes
Ficha Técnica
 Título: Benfica-Torino 4-3
Realização: Andrea Ragusa e Nuno Figueiredo
Produção: Figura Film
Edição: Massimo Gasole
Música original: Mauro Carrero
Duração: 58 minutos
Participação de: Rogério "Pipi", Artur Santos, José Bastos, Vítor Cândido, Rui Tovar, Nuno Domingos, David Sequerra, Jaime Pereira, Rosalina Lopes Gomes, Luís Lapão, Carla Maroso, Domenico Beccaria, Giampaolo Muliari, Piero Gay, Andrea Gatta, Alberto Helder, Nuno Lobo.
Apoio: Associazione Memoria storica granata e Museo del Grande Torino (Turim)

Legenda: a imagem é retirada do trailer do filme.

quinta-feira, 21 de março de 2013

OLHAR AS CAPAS

´
Gente de Terceira Classe

José Rodrigues Miguéis
Capa: Luís Filipe de Abreu
Editorial Estúdios Cor, Lisboa Novembro 1962

… E o Silvestre, pobre amigo, lá vai, metódico e pausado, com o seu perfil imperial romano, sonhando com o futuro-que-passou, sem perceber que só tem porvir quem tem presente, e ele nunca o teve: porque o futuro do homem está no que ele hoje semeia ou cria, no que dele cresce e frutifica, e não no que se acumula, repousa e fossiliza.

quarta-feira, 20 de março de 2013

O QU'É QUE VAI NO PIOLHO?


Não tenham qualquer dúvida: Deus Sabe Quanto Amei é um dos mais belos filmes da história do cinema.
Se nunca viram, a Cinemateca, na próxima quinta-feira dia 21 pelas 15,30 ,exibe-o na Sala Dr. Felix Ribeiro.
Claro que o podem ver em DVD, ou em qualquer outra tecnologia, mas acreditem que este é dos tais filmes – não serão todos? – que, pela cor, pelo cinemascope, por tudo, apenas pode ser devidamente desfrutado na sala escura de um cinema.
Não gosto da expressão, mas, Deus Sabe Quanto Amei,  é uma dos filmes da(s) minha(s) vida(s).
João César Monteiro, no seu filme testamento Vai-Vem, não resistiu, e na lateral de um autocarro escreve Some Comming Run em vez do anúncio que viajava no autocarro.
Tenho por hábito que, quando outros dizem as coisas melhor do que eu, não hesitar e passar à transcrição.
É o caso do que João Bénard da Costa escreveu sobre este deslumbrante filme, um filme que ele colocou na gaveta dos filmes da sua vida:
Em Some Came Running, só se corre aparentemente no final, esse final alucinante, das múltiplas montagens paralelas, com Dean Martin e o assassino a tentarem ser mais velozes do que os fados na busca de Shirley MacLaine e Frank Sinatra, recém-casados e engolidos pela multidão que comemora, na feira de todos os carrocéis, o centenário da cidade de província (Parkman, Indian) onde a acção decorre. Só nessa altura descobrimos que o tempo correu todo o tempo, e que todos o perderam.A sensação que temos, quando relembramos este filme, é que houve tempo para tudo e subitamente não há tempo para nada.
Houve tempo para conhecermos a família de Dave (Frank Sinatra), com o irmão pusilânime, a cunhada sinistra e a sobrinha bonita. Houve tempo para conhecermos a professora puritana, essa Miss French (Martha Hyer) que às vezes lembra Eva-Marie Saint e que usava carrapito com medo que lhe soltassem os cabelos, como Sinatra fez naquela única e incrível tarde de amor deles. Houve tempo para muitos batoteiros e muitas pegas, paisagem acidental e essencial para dela emergirem Bama (Dean Martin), o homem que nunca tirava o chapéu, e Ginny (Shirley Maclaine), a mulher que nunca




largava a mala de mão em forma de coelhinho de peluche. Houve tempo, até para uma bela e efémera secretária, Miss Barclay (Nancy Gates), que rima com todo o resto. Só não houve tempo para o tempo do mais belo amor da mais bela mulher, Ginny-Shirley, essa que veio a correr e morreu no fim para salvar Sinatra, que lhe deitou a cabeça em cima da berrante almofada amarela que a pedido dela lhe dera, e que era a coisa de que ela mais gostava no mundo.
«Menina e moça me levaram de casa da minha mãe. Qual fosse a causa daquela minha levada, era pequena não na soube entào.» "Some Came Running" fez-me sempre lembrar o começo da novela de Bernardim. Quando Shirley MacLaine acorda no autocarro onde até aí não a víramos (a câmara só nos mostrara Sinatra a dormir), depois de ler o anúncio da companhia transportadora («and leave the driving to us») ou de ouvir o primeiro diálogo dela com Sinatra («You're a nice kid. I like you. Take care»), sinto essa sensação de «levada», um dia, menina e moça (Shirley MacLaine que o não era, era-o mais do que outra nenhuma), de «casa da minha mãe» (sempre gostei mais dessa variante do texto do que da usual, que diz «de casa de meus pais») por causas que os pequenos nunca sabem, que faz parte de serem pequenos nunca saberem. Há, no filme de Minnelli, uma mesma dupla acentuação da inocência, a mesma saudade por um quente mundo perdido, a mesma viagem, o mesmo lento sublinhar do tempo, do "então". E, mais importante ainda, a mesma equivalência nas cores, no décor e nos olhos de Shirley MacLaine para as labiais de Bernardim, com o corte final (a "dental") do "então", no movimento sublime, duma rapidez feita tanto de reflexo, como da ausência de reflexão, com que a moça menina se atira para cima do corpo de Sinatra, apanhando em cheio nas costas a bala que a ele era destinada.
Centro deste filme prodigioso, o mais bonito personagem que o cinema alguma vez inventou, Ginny é menina e moça perdida na vida e perdida na morte, no sentido em que também se diz "mulher perdida", "mulher da vida", tão belas expressões, E no fim, no enterro dela, percebemos que se Dean Martin nunca tirou o chapéu, foi para o tirar nesse momento, para a única mulher que a esse gesto obrigava.
Metera-se, uma noite, num autocarro e atravessara centenas de quilómetros porque Sinatra, sentimental de mais quando bebia de mais, a convidou a segui-lo. Passada a bebedeira, na manhã da chegada a Parkman, ele já nem se lembrava dela. Mas lembrava-se ela e ficava, numa ida sem volta, apesar da nota de 50 dólares que Sinatra lhe metia na mão.



 E ficava, atrapalhada, atrapalhante, sem perceber de que terra era, sempre com coisas a mais nas mãos (a tal carteira, a tal almofada, as flores artificiais), sempre com os penduricalhos, sempre a pintar os olhos, a pôr rimel nas pestanas, «leaving the drive to others».
E há as duas sequências mais inesquecíveis.
A primeira é quando decide ir até à escola, conhecer a professora por quem Sinatra se apaixonara, para "tirar a limpo" aquela história. A professora ensina literatura e explica aos alunos que as bebedeiras de Poe, as drogas de Quincey, a "neurótica promiscuidade" de Baudelaire não os tornavam menores. «Eram grandes homens, grandes na força, grandes nas fraquezas.» A campainha toca no fim desse parvo discurso. E enquanto os estudantes saem, aparece na frente daquela mulher que sabe tudo e não percebe nada, a mulher que não sabe nada e percebe tudo. Vem nervosíssima, timidíssima, amedrontadíssima. Se a professora gostar tanto de Sinatra quanto Sinatra gosta dela, todos os seus sonhos morrerão ali. Como ela própria diz, na profundidade de campo da aula vazia, contra um quadro onde está escrito um texto de Zola: «You don't know how scared I was. I want him to have whatever he wants. Even if it means you instead of me.» Durante toda a sequência, não disse nem fez uma coisa feia. Só ganhou o campo-contra campo porque a professora era incapaz de olhar para além do campo dela e ver para além das aparências a "rival" que não tinha nada, «not even a reputation».
A segunda sequência é pouco depois, quando Sinatra chega a casa, possesso de dor de corno, porque Miss French lhe dera com os pés («I don't like your life. I don't !ike what you think. I don't like the people you like») na ressaca desse face a face com a «pega».
 Sinatra insulta-a a despropósito. Há uma panorâmica sobre ela e ela a dizer «You gotta remember I'm human. I've feelíngs». Depois, Sinatra arrepende-se. Mas tudo quanto tem para dar àquela mulher que antes tinha dito que era capaz de fazer tudo, tudo quanto ele lhe pedisse (e veio a fazer mais) é perguntar-lhe: «Do you clean that place for me?» E o que a frase podia ter de horrível ou frustrante é salvo pelo sorriso de Shirley e aquele «Oh! Could I?», como se acabasse de receber o mais belo dos presentes.
Corte e Sinatra lê-lhe o romance com que acabara de ganhar um prémio. Sentada no chão, os braços à volta dos joelhos, de calças cor-de-rosa, Shirley está toda nele e nada




no que ele diz. E, quando ele a acusa de não ter percebido uma palavra do que ouvira, ela responde com esta tirada prodigiosa: «No, I don't. But that don't means I don't like the story. I don't understand you, neither, but that don't means I don't like you. I love you, but I don't understand you. What's the matter?» Vira a cara para o lado, amuada. Há uma "pausa côncava de assombro" preenchida apenas pela espantosa partitura de Elmer Bernstein. A câmara fica fixa no rosto de Sinatra, e tudo quanto o filme e a vida até aí acumulara nele (tempo, décor, cidade, néons, família, a loura e frígida professora) sai cá para fora no inesperado pedido de casamento. Segue-se a incredibilidade de Shirley («Não deves brincar com essas coisas») e depois o abraço, abraço incrível de entrega e doação. Há o degrau e a coda volta ao início: «You gotta remember, I'm human.»


Nestas duas sequências – como na sequência final do crime, como em todo o filme – Minnelli atinge o apogeu da sua arte. Há cineastas, como há pessoas, que procedem por silogismos e assim destroem tudo e se destroem a si próprias. Há cineastas, como há pessoas, que estãoa para além de qualquer lógica e transfiguram tudo o que tocam em oração e oblação. Nessa delirante irracionalidade do amor, apanágio de tão raros. Como diria Shirley MacLaine: «Thanks, awfuly, so awfully much.»
João Bénard da Costa em Os Filmes da Minha Vida, os Meus Filmes da Vida, Ass´rio & Alvim, Lisboa Novembro 1990.

À LUPA


Neste momento, já não estamos nos anos 80/90. Estamos no século XXI. De que é que precisa a Igreja para escutar os desafios do mundo de hoje e participar na descoberta de novos caminhos para uma civilização que já não sabe de que terra é?
Frei Bento Domingues no Público.

terça-feira, 19 de março de 2013

OLHARES


Lisboa, Escadinhas do Duque.

QUOTIDIANOS



Estas palavras podem ler-se no Chiado, mesmo ao lado da estátua de Fernando Pessoa, à porta da Brasileira.
O Chico Buarque diz numa canção que devagar é que não se vai longe.
Num cartaz, na manifestação de 2 de Março, um cartaz dizia:
Quem adormece em democracia acorda em ditadura.
Portugal é governado por um bando de garotos incompetentes.
A Europa é governada por um bando de loucos incompetentes.
Um pesado enjoo que se chama inquietação
Como podemos sair disto?
Será que o futuro parece sempre impossível?
Neruda dizia que era azul, mas só se vê escuridão.
Culpa dos nossos olhos, ou da nossa inacção?
Culpa dos nossos olhos?
- A longo prazo tudo se resolverá.
- Mas aí estaremos todos mortos!

BUCÓLICA


A vida é feita de nadas:
De grandes serras paradas
À espera de movimento;
De searas onduladas
Pelo vento;

De casas de moradia
Caídas e com sinais
De ninhos que outrora havia
Nos beirais;

De poeira;
De sombra de uma figueira;
De ver esta maravilha:
Meu pai a erguer uma videira
Como uma mãe que faz a trança à filha.

Mihuel Torga

segunda-feira, 18 de março de 2013

MARCADORES DE LIVROS

À LUPA


Caso Isaltino Morais.
Quem tem o poder de pôr um ponto final?
Procurador de Oeiras defende que Isaltino Morais já devia estar preso há ano e meio.
Um membro do Conselho Superior da Magistratura diz:
É um desconsolo ver este circo de recursos.
Imagem e elementos retirados de edição do jornal I de 13 de Março.

É PERMITIDO AFIXAR ANÚNCIOS


Um anúncio impensável nos dias de hoje.
Encontrei-o na Vida Mundial de 31 de Julho de 1970.
Um cigarro que dá kilómetros de prazer
Robert Louis Stevenson, o conhecido autor de, entre outros livros, A Ilha do Tesouro, era de opinião que nenhuma mulher deveria casar com um homem que não fumasse.

domingo, 17 de março de 2013

EVITAMOS FALAR DISSO...


Noticia o Diário de Notícias que, no domingo passado, entre as 10 da manhã e as 10 da noite, foram encontrados mortos em Lisboa e levados pela PSP para o Instituto de Medicina Legal nove velhos. Viviam quase todos sozinhos, abandonados por filhos e família, sobrevivendo com a ajuda de vizinhos ou da Misericórdia, e pelo menos um deles tinha-se, em desespero, enforcado.
Segundo a notícia, só as autópsias revelarão as "causas" dessas mortes. Só que nem os bisturis dos patologistas nem a química dos analistas podem alcançar no terrível e silencioso cancro social que ceifa hoje, em Portugal, a maior parte dos nossos velhos, a solidão. Expulsos da família e da sociedade, os velhos "atravessam o presente desculpando-se por não estarem já mais longe" e, amontoados em sórdidos "lares" e hospitais públicos ou entregues a si mesmos, trilham, desamparados, o resignado e último percurso "du lit à la fenêntre, puis du lit au fauteuil, puis du lit au lit" e às campas rasas dos cemitérios. Evitamos falar disso porque a principal doença de que morrem hoje os velhos é uma doença nossa, vergonhosa, que nos culpa a todos.

Crónica de Manuel António Pina no Jornal de Notícias de 6 de Janeiro de 2010.

Legenda: fotografia de Svyatoslav Sidash.

QUOTIDIANOS


Aos domingos costumava ir ao centro da cidade para caminhar pelas ruas desertas.

Rubem Fonseca em Bufo & Spallanzani, Sextante Editora, Poro Editora, Fevereiro de 2011.

sábado, 16 de março de 2013

NOTÍCIAS DO CIRCO


O VOLKSWAGEN PASSAT DO BISPO DE BRAGANÇA caiu do parque de estacionamento do Paço Episcopal, que fica cerca de três metros acima do nível da rua.
A viatura esmagou um Renault Clio, que se encontrava estacionado junto às bombas da CEPSA da Casa de Trabalho, em Bragança.
O carro tinha sido comprado há poucos dias e era a primeira vez que D. José Cordeiro o conduzia.
O gabinete de comunicação do paço episcopal atribuiu o acidente a uma «falha técnica».
Ficou por esclarecer, face aos tempos de crise que o país atravessa, as dificuldades financeiras que a igreja diz que atravessar, a razão de um carro tão topo-de-gama.
Definitivamente, a crise não é para todos!...

O MINISTRO GASPAR não acerta um único número.
Numa agonizante conferência de impresa , ontem, disse aos portugueses, que o PIB cairá 2,3%, em vez do 1% “previsto” pelo governo, ao mesmo tempo que o desemprego poderá atingir os 19% no final do próximo ano, e tem esta tirada hipócrita, nojenta, tudo o que de mau lhe quisermos chamar:
O desemprego é um flagelo pessoal, familiar e social. Uma das experiências mais traumáticas.
A isto Pedro Passos Coelho Passos diz que estamos no bom caminho, o cherne que é presidente da Comissão Europeia garante que o programa da troika em Portugal está a ser executado correctamente e que um dos objectivos do plano de resgate português é o regresso do país aos mercados.

SÉRGIO LAVOS no blogue Arrastão:

Num país que promovesse a meritocracia, Vítor Gaspar já teria sido despedido há muito tempo, Miguel Relvas não passaria de um reles empresário da noite e Passos Coelho seria um perdido da vida. Num país onde os políticos servissem o povo e não se servissem do povo e da riqueza que este produz, nunca deslumbrados incompetentes como Passos Coelho e canalhas corruptos como Miguel Relvas chegariam a cargos de poder. Num país que tivesse respeito por si próprio, nunca teria sido eleito Cavaco Silva, a múmia cínica e interesseira que nos calhou como presidente. Num país onde existisse verdadeira cidadania, verdadeira participação política de todos os cidadãos, este Governo já teria caído há muito tempo. Num país onde nada disto existe, teremos "décadas de austeridade", de exploração, de miséria, de transferência de rendimento dos mais pobres para os mais ricos. Estamos todos de parabéns.

MARQUES MENDES há Minutos na SIC-Notícias:

Eu ouvia ontem o ministro das Finanças. Aquilo parecia-me o administrador financeiro de uma grande empresa falida a ler um relatório burocrático e administrativo, sem soluções e sobretudo sem uma mensagem de esperança. Um director-geral não fazia diferente. Mas um ministro tem que ser muito mais do que um director-geral.

NA SEMANA EM QUE SOUBE QUE, para além de outros indicadores, o número de casais em que ambos estavam desempregados era de 12987 em janeiro, um aumento de 89% face ao mesmo mês de 2012, uma sondagem encomendada à Universidade Católica pelo Diário de Notícias, a RTP e a Antena 1 ,revela que a maioria dos inquiridos, apesar da crise e contestação crescentes, apesar de 77% dos classificar negativamente a acção governativa, colocou o PSD a escassos 3% dos socialistas.

NACIONALIZAÇÃO DOS SEGUROS


Continuavam os dias alucinantes pós 11 de Março de 1975.
Depois da nacionalização da banca, o país ficava a saber que o Conselho Superior da Revolução decretava que as companhias de seguros também eram nacionalizadas.
Na edição de 20 de Março da Vida Mundial podia ler-se o seguinte título:
Começou a revolução?
O mercado de seguros no nosso país era dominado por cinco grandes companhias: Império, Tranquilidade, Mundial, Confiança e Comércio e Indústria, basicamente controladas por cinco grandes grupos financeiros: C.U.F., Champalimaud, Espírito santo, Jorge de Brito e Pinto de Magalhães.
Só por si a Companhia de Seguros Império detinha cerca de um quinto do mercado e exercia, conjuntamente com a Tranquilidade e a Mundial, uma influência declaradamente do tipo monopolista.
Neste dia ficava saber-se que, após algumas hesitações, o governo brasileiro dava asilo político ao ex-general Spínola...
À chegada a São Paulo, Spínola apressou-se a desmentir que tivesse afirmado não  desejar voltar algum dia a Portugal, ao mesmo tempo que declarava que se dedicaria a «actividades intelectuais», com o propósito de escrever um livro: «Reflexões sobre os Dilemas do Mundo Contemporâneo».
Mas o antigo governador da Guanabara, Carlos Lacerda, afirmava, ao Jornal da Tarde, que o ex-general «está decidido a continuar a luta».