Fernando Assis
Pacheco, quando entrevistou Carlos Paredes para os seus Retratos
Falados, intitulou a entrevista: «O Filho do Rei Artur».
Carlos Paredes
era um homem que detestava falar de si próprio.
J. Plácido
Júnior que assina, na revista Visão, a evocação dos 100 anos do
nascimento de Carlos Paredes, conta a seguinte história:
«Se como pessoa e músico, provocava emoções fortes em
terceiros, Paredes era, em contraponto, de uma modéstia desmesurada. Um bom
exemplo está numa história relatada pelo jornalista e escritor António Costa
Santos, que perdeu a conta às entrevistas que lhe fez. Numa dessas vezes, levou
consigo o álbum Espelho de Sons, de 1988, para o guitarrista lhe autografar a
capa. “E ele escreveu: “Com a admiração do Carlos Paredes.” António Costa
Santos ficou estupefacto: “Ó Paredes, então vai pôr-me aqui com admiração?!...
Quem o admira sou eu” Que não defendia-se o guitarrista, “O amigo é muito
importante”. Conclusão: “Não posso mostrar isto a ninguém. É uma vergonha”,
ri-se hoje António Costa Santos, embora na altura tenha ficado virado do avesso
com Paredes.”»
Fernando Assis Pacheco lembra a Carlos Paredes que, em
Maputo, foi aplaudido de pé no final do espectáculo.
Paredes lembra logo que as palmas não foram para ele,
mas para o Malangatana - «já viu o meu descaramento?» - porque
atreveu-se a pedir ao pintor que no palco pintasse um quadro enquanto ia
improvisando música de acordo com o que via surgir na tela.
«O Malangatana prezou de tal maneira este contacto com
um músico português que escolheu três telas virgens, oferecidas por um grande
pintor moçambicano seu mestre e, sobre elas fez três quadros. Entendemo-nos
perfeitamente. Eu ia vendo surgir as cores e as formas, e entusiasmava-me.»
Rui Vieira Nery,
num artigo no JL:
«Raros terão sido os criadores musicais portugueses
das últimas décadas, em qualquer género, que tanto tenham marcado, como
referência indispensável e querida, o nosso imaginário musical e o nosso prazer
elementar de ouvir música.»
O pintor Júlio
Pomar:
«O país onde o Carlos Paredes fez a sua música numa
nuvem de merda com algodão em rama por fora. O que dava arranjo a certos que
hoje ainda choram de saudades desses tempos.»
A escritora
Lídia Jorge:
Cresci e fiz-me adulta, pensando que a guitarra
portuguesa era o Paredes. Isto é, a guitarra portuguesa e Paredes eram, para
mim, coincidentes, mesmo uma única coisa.»
A este génio, a este talento do tamanho do mundo, a ditadura portuguesa, nos princípios dos anos 60, atirou-o para os calaboiços da PIDE. Esteve lá um ano e meio, acabando por expulso da função pública, após o julgamento.
Ruy Vieira Nery:
«Era um príncipe que não soubemos merecer. E no momento desta última despedida só consigo lembrar-me das palavras do Hamlet: Adeus, doce príncipe»
«No dia em que me cruzar com o russo que me atirar à cara o “Guerra e Paz” e o americano que me tente ofuscar com o Grand Canyon, eu pergunto-lhes: “Têm dois minutos e vinte e sete segundos?” Se não, pior para eles. Se sim, ficarão agradecidos para o resto da vida. Ponho-os a ouvir “Mar Goês”.
Mar Goês é a prova que sim. Sim, um dia os portugueses entraram em pequenos barcos e tornaram o mundo grande, porque completo. Havia de ser um amanuense do Hospital de São José, um tímido com andar estranho, que me confirmaria que já houve portugueses fortes. Os dedos de Carlos Paredes são como os lenhadores do pinhal de Leiria, são como o marinheiro que subia à gávea, são como o capitão que dizia por ali e não cedia.»
Ferreira Fernandes
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