quarta-feira, 11 de dezembro de 2024

SONETO

Tempo das cerejas agressivas

A avançar pelo meu quarto dentro.

Velho tempo das noites explosivas

Em que o sangue crescia como o vento!

 

Tempo –aproximação das coisas vivas,

Do seu hálito doce, violento.

Tempo – horas e horas convertidas

No outro raro e inútil dum lamento…

 

Tempo como uma ferida no meu lado,

Coração palpitando sobre a lama.

Tempo perdido, sangue derramado,

 

Resto de amor que se deixou na cama

Horizonte de guerra atravessado

Pelo corpo audaciosos duma chama.

 

Alexandre O’Neill em No Reino da Dinamarca 

5 comentários:

Pedro L. Cuadrado disse...

"Tempo das cerejeiras agressivas..."

Sammy, o paquete disse...

O poema do Alexandre O’ Neill é copiado da edição de 1967 de «No Reino Da Dinamarca» publicado pela Guimarães Editores na sua Colecção Poesia e Verdade.
É provável que O’ Neill tenha feito alguma modificação numa edição futura do livro.
De qualquer forma muito obrigado pela sua colaboração.


Pedro L. Cuadrado disse...

Eu conhecia o poema pela edição das «Poesias Completas 1951/1983» da Imprensa Nacional (1984). É possível a palavra ‘cerejas’ dessa edição de «No Reino da Dinamarca» ser uma gralha, visto que assim o verso fica com apenas nove sílabas; com ‘cerejeiras’ temos o clássico decassílabo dos sonetos.
Abraço

Sammy, o paquete disse...

Entre cerejas e cerejeiras está correcta a sua afirmação no que ao soneto diz respeito.
Na Biblioteca da Casa também existe essa edição da Poesia do O’Neill, da Imprensa Nacional. em que se pode ler que é uma edição revista e aumentada. Revista por quem? Pela Clara Rocha, a organizadora do volume? Ou pelo O’Neill, um libertador de imagens e de imprevistos que, segundo os que o estudam, é impossível fazer o inventário?
Também existe na Biblioteca, o «Tomai Lá do O’Neill», antologia organizada pelo António Tabucchi, mas o «Soneto» não foi antologiado.
Quanto a ser gralha, a questão não (?) se coloca porque nas «Erratas», no fim de «No Reino da Dinamarca», existem 9 de «Deve ler-se…» e dessas qualquer gralha no «Soneto» não é mencionada.
Um abraço pela útil troca de impressões.
Ainda há Futuro!

Pedro L. Cuadrado disse...

Agradeço as informações. E tem razão, com o O'Neill nunca se sabe (mas eu fico com as 'cerejeiras': é o costume, depois de tantos anos). Agradeço também o desfecho das suas palavras que me fez sorrir.
E uma "curiosidade": comprei o meu livro do O'Neill em Lisboa no dia 21 de julho de 1986. Alguém que o conhecia, disse-me que ele não andava muito bem. E morreu a 21 de agosto! Essas coisas do acaso...
Enfim, vamos lá para o Futuro!