segunda-feira, 16 de dezembro de 2024

REFRESSO

Já voltei a casa, as portas rangem,

o pó tomou conta de todos os móveis,

deixando-me de pé, a balançar as chaves,

e a interrogar-me sobre o que não fiz.

 

O tempo que resta não é para confissões

nem para ajustes de contas:

pois quem guarda o guardião, quem despe a roupa

das vestais do templo?

A água corre ainda, um fio sequer, de torneiras

em desuso. Respiro e não deixo de olhar.

Até ao fim não deixarei de olhar.

 

Que trabalho é este, oculta e extinta miséria

sob os nossos passos?

As janelas com os vidros quebrados, o plástico

por cima dos horizontes perdidos

da transparência. Porque insistes? Porque ficas

à entrada da casa, perdido no olhar

e na memória do que nunca chegou a ser?

 

Luís Filipe Castro Mendes em Poemas Reunidos

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