domingo, 25 de julho de 2021

OTELO SARAIVA DE CARVALHO (1936-2021)


Morreu Otelo Saraiva de Carvalho.

Controverso, nunca intocável, mas uma referência da nossa História recente.

Em pequeno quis ser actor, mas nunca pensou que a História já lhe reservara um papel transcendente.

Numa daquelas anormalidades com que a justiça, civil e militar, perseguiu Otelo, em Junho de 1979, passaram-no à reserva.

Maria Velho da Costa um dia escreveu: VOCÊS PAGAM!

Não pagaram.

Talvez ainda paguem!

Nesse tempo de Junho de 1979, foi lembrado que há os que ganham mesmo quando perdem e Manuel Alegre escreveu um poema.

 

A ORDEM RESTABELECIDA

 

«Otelo foi passado a reserva.

A ordem foi restabelecida e nessa noite

as pessoas de bem dormiram descansadas.

Mas nalguns bairros de Lisboa

ouvi dizer que os pobres e os sonhadores

alguns poetas

e outros descamisados

da vida

sentiram-se uma vez mais despromovidos.

Eu mesmo

(que não estava de acordo com Otelo)

senti dentro de mim

a página a virar ou se preferem

uma passagem à reserva compulsiva

de qualquer coisa como que partida.

Não propriamente da esperança

(porque essa não será despromovida).

Mas talvez da alegria. Aquela parte de alegria

que não cabe na ordem restabelecida.»

 

2 comentários:

António Ladrilhador disse...

Uma referência, sem dúvida, mas em diversas vertentes. A morte levou-me a refletir com a lucidez e objetividade possíveis sobre a figura de Otelo Saraiva de Carvalho e o seu papel político e social na vida portuguesa. Se tiver tempo para gastar, convido a uma leitura em https://mosaicosemportugues.blogspot.com/2021/07/otelo-o-espinho-que-nem-morte-arrancou.html .

Sammy, o paquete disse...

Não é nada a minha maneira de ser, mas poderia não ter assinalado a morte de Otelo, o que seria um perfeito disparate.
A importância de Otelo está no planeamento do 25 de Abril, a noite que passou na Pontinha, o livro que nos deixou, «Alvorada de Abril», com pormenores interessantes para a história do Movimento dos Capitães. Poderia ter regressado a casa, como tantos e tantos camaradas seus fizeram. Mas a vaidade era demasiado forte para quem sempre sonhou ser actor.
Percorrendo algumas fontes, creio ter formado a ideia de que a presença do seu nome nas «FP25 de Abril», é apenas isso: usaram-no como bandeira, seja lá o que isso for.
Não ter pressentido esse pormenor, remete-o para a parte lamentável do seu caracter.