segunda-feira, 28 de dezembro de 2020

AINDA, E SEMPRE, O NATAL!


  

Todos os anos, pelo Natal, o Abílio oferece-lhe uma cassette (objecto em vias de extinção e o Abílio queixa-se que, cada vez mais, se torna difícil encontrá-las).

Grava-lhe coisas “fixes”, coisas “velhinhas”, diz ele.

Como não tem misturador, o Abílio perde horas para que a cassette não tenha “brancas” e as canções tenham um alinhamento.

De algumas das musiquinhas gosta, de outras não, mas isso é a velha história.

Poderia passar o Natal sem uma cassette do Abílio, mas não era bem a mesma coisa. Um pouco como aqueles tios amalucados que aparecem na Festa de Natal: incomodam quando estão; sentimos saudades quando faltam.

Foi a arrumar a cassette deste Natal em “su sitio”, onde há alguns anos alinha as cassettes, oferecidas pelo Abílio, que se lembrou de uma tirada do livro AltaFidelidade, de Nick Hornby.

Foi reler e não achou disparatado fazer a transcrição:

Passei horas a alinhar a cassete. Para mim, gravar uma cassete é como escrever uma carta – tenho de apagar muito, repensar e começar outra vez de início, e eu queria que a cassete ficasse boa, porque… para falar verdade, porque nunca tinha conhecido nenhuma mulher tão promissora como a Laura desde que tinha começado a pôr música, e conhecer mulheres promissoras era parte da profissão.

É difícil fazer uma boa cassete de compilação, tal como é difícil acabar uma relação. É preciso abrir com uma música surpreendente, para captar a atenção (comecei com “Got To Get You Off My Mind”, mas a seguir percebi que ela podia não passar da primeira faixa do lado A se eu desse logo tudo, por isso encaixei-a a meio do lado B), e depois sem se pôr uma mais enérgica ou mais calma, e não se pode misturar música branca com música negra, a menos que a música branca seja parecida com música negra, e não se pode pôr duas faixas do mesmo artista ao lado uma da outra, a menos que se tenha posto todas aos pares, e… oh, há imensas regras.

Seja como for, fartei-me de trabalhar, e ainda tenho meia dúzia de “demos” antigas espalhadas pela casa, cassetes-protótipo em relação às quais fui mudando de ideias. E na sexta-feira à noite, tirei-a do bolso do blusão quando ela veio ter comigo, e seguimos caminho a partir dai. Foi um bom início.

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