quarta-feira, 21 de dezembro de 2022

EXPLICAÇÃO NECESSÁRIA

Há certos versos - às vezes poemas inteiros -

que eu próprio não sei o que querem dizer. O que ignoro

retém-me ainda. E tu, tu tens razão em interrogar. Não interrogues.

Já te disse que não sei.

                                         Duas luzes paralelas

vindo do mesmo centro. O ruído da água

que cai, no inverno, da goteira a transbordar

ou o ruído de uma gota de água caindo

de uma rosa no jardim, regado há pouco,

devagar, devagarinho, uma tarde de primavera,

como o soluço de um pássaro. Não sei que quer dizer este ruído; contudo aceito-o.

As coisas que sei explico-tas,

sem negligência.

Mas as outras também acrescentam a nossa vida.

Eu olhava

o seu joelho dobrado, como ela dormia,

levantando o lençol -

não era apenas amor. Este ângulo

era o cume da ternura, e o cheiro

do lençol, a lavado e a primavera, completava

este inexplicável, que eu procurei,

em vão ainda, explicar-te.

 

Yannis Ritsos

Tradução de Eugénio de Andrade

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