terça-feira, 25 de março de 2014

SARAMAGUEANDO


Já mais de uma vez por aqui disse que gosto muito de Manual de Pintura e Caligrafia de José Saramago.

Pelo tempo em que o comprei, pelo tempo em que o li, pelo tempo em que pressenti que por ali andava coisa boa, mas só muito lá para a frente dos anos se saberia que ao autor lhe atribuiriam o Nobel da Literatura.

Na minha visita quase semanal, à Frenesi Loja, topei com um informe de que está à venda a 1ª edição do Manual de Pintura e Caligrafia pelo preço de 180,00 euros, com a garantia de bom estado e miolo limpo, e a Frenesi nunca engana quem por lá passa ou encontra os proprietários, aos sábados, no Chiado, junto à Bertrand.

Interessante o acrescento de Joana Varela, que os livreiros colocam na apresentação do volume, e que termina com um tímido recomendável.

Das fichas de leitura do serviço de Bibliotecas Itinerantes da Fundação Calouste Gulbenkian, assinada por Joana Varela em 1984:
«Se José Saramago quisesse ser exacto e gostasse de desvendar segredos, em vez de “Manual de pintura e caligrafia”, chamaria muito simplesmente ao seu livro “Manual de vida”, porque, no fundo, é só disso que se trata: Um pintor de retratos da alta burguesia lisboeta, H., começa simultaneamente o retrato “oficial” de S., administrador de uma empresa, um retrato clandestino onde procura pôr o que no primeiro se escapa e uma espécie de diário. A como que finura que o segundo retrato instala na sua pintura, é homóloga da finura da reflexão que a escrita inaugura – e ambas tendem para a ruptura: do modo de vida, do modo de arte, do modo de pensamento. Tudo acaba por convergir numa teoria, aliás por diversas vezes expressa no livro: toda a literatura é autobiográfica, todo o retrato é auto-retrato, toda a forma de arte é forma de vida. E vice-versa. O que o livro relata, portanto, é, na primeira parte, uma conversão à estranheza da intimidade e, na segunda, à sua habitação – no entanto, porque o escritor só deve falar de tudo que sabe, a primeira parte, a do cinismo, a da distância, a da auto-impiedade é infinitamente superior à conclusão, adocicada por um encontro que tem a dupla vantagem e cegueira de ser amoroso e político. De qualquer forma, [...] pensamos que a sua aquisição é recomendável.».

Face às observações dos donos da Frenesi Loja, constato que a maior  parte dos livros da minha biblioteca, vivem do problema de que estão fartamente manuseados e, porque largamente sublinhados, não apresentam miolo limpo.

Mas não consigo entender os livros de uma outra maneira o que, certamente, não agradará aos vindouros que os queiram vender para comprar bilhetes para o cinema, coca-cola e baldes de pipocas.

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