sexta-feira, 1 de novembro de 2019

QUOTIDIANOS


Miguel Torga diz que o homem é em si uma solidão:

«Nascemos sós, vivemos sós, morremos sós.»

Buscar aquele livro do Ray Bradbury «A Morte é um Acto Solitário», citar o espantoso início:

«Veneza, na Califórnia, tinha, nos velhos tempos, muito que a pudesse recomendasse a quem gostasse de estar triste. Era o nevoeiro quase todas as noites, e era, ao longo da costa, o gemer das máquinas nos poços de petróleo, e o bater da água suja nos canais, e o zumbir da areia a roçar as vidraças, quando o vento assobiava à volta das praças e ao longo das ruas desertas.
Era no tempo em que o pontão de Veneza, a cair aos bocados, morria no mar. E podia ver-se então gigantesca ossada de dinossauro, a montanha-russa, a coberto ou a descoberto, com o vaivém das marés.
No fim de um longo canal, viam-se as caravanas de um circo, decrépitas, para lá atiradas e abandonadas. E quem olhasse para as jaulas, à meia-noite, veria que lá dentro havia vida – peixes e camarões de água doce, que andavam ao sabor da maré. E tudo isto, afinal, era o circo do tempo, feito ruína, desfazendo-se em ferrugem.»

Ou fazer deslizar a agulha do gira-discos por um velho vinil de Brel:

«E que todos se divirtam como loucos, que todos dancem. No dia em que me meterem na cova.»

1 comentário:

" R y k @ r d o " disse...

Jacques Brel um interprete fabuloso.
.
Feliz fim de semana