terça-feira, 10 de janeiro de 2023

O OUTRO LADO DAS CAPAS


 Partirei para as terras do fogo sem colocar, neste Cais, metade que seja dos livros da Biblioteca da Casa.

A morte de António Cartaxo deu para, tristemente, constatar que nunca coloquei no Olhar as Capas, o livro Quase Verdade Como São Memórias, se bem que andam a apssear por aí alguns excertos. Apenas Ao Sabor da Música chegou ao Olhar. E terei que voltar aos alfarrabistas para tentar encontrar os restantes livros: BBC Versus Portugal. História de um Despedimento Político, Palavras em Jogo, O Meu Primeiro Mozart. Efemérides Românticas.

Porque António Cartaxo escrevia muito bem, para além de ser um extraordinário divulgador de músicas e suas histórias. Tinha uma bela voz e é responsável pela formação de uma vasta legião de amantes da música clássica. Eu, que  já trazia o vício cedido pelo meu pai, ampliei esse gosto com o contributo do António Cartaxo.

Uma vida cheia, uma alegria transbordante que proporcionou a uma série de gente, gente interssada. Como ele um dia disse, citando um filósofo: «Dizem mais os que dizem menos.»

Se forem ao site da Antena 2 poderã encontrar alguns dos programas que Cartaxo, exemplarmente, deixou por ali e pena foi que não o tivessem aproveitado muito mais.

A morte de quem gostamos marca-nos sempre. Ainda hoje aqui não consegui colocar uma palavra que seja sobre a morte de Chalana, o pequeno genial.

Apesar de ter sido professor na Faculade de Letras, António Cartaxo dizia que não se imaginava viver sem rádio.

Gostava de música, gostava de a divulgar, gostava de viver, gostava dos outros, gostava do Benfica: «O meu irmão fez-se sócio do Benfica e o cartão passou a dar para os dois. Como? Do topo norte da bamvada de sócios do Bemfica, ele lançava-me um projéctil com o cartão atado para o campo de treinos do Sporting, de acesso livre , contíguo ao campo do Benfica, onde eu aguardava a queda do embrulho. Com o mesmo cartão de sócio entrava eu a seguir. Vi assim num campeonato todos os jogos que o Benfica disputou em casa.»

O meu avô Mário, republicano histórico, anti-clerical e benfiquista, a dizer-me num tempo qualquer: «Seríamos pessoas diferentes, outras mesmo, se não fôssemos do Benfica.»

Em memória de António Cartaxo, enquanto escrevo este texto, uma peça de que Cartaxo muito gostava, A Porta de Kiev, último quadro de Quadros de Uma Exposição de Mussorgsky:

«Fiel a um primeiro amor, conto-me hoje entre os mais devotos colecionadores de Quadros de Uma Exposição».


3 comentários:

Seve disse...

O meu avô Mário, republicano histórico, anti-clerical e benfiquista, a dizer-me num tempo qualquer: «Seríamos pessoas diferentes, outras mesmo, se não fôssemos do Benfica.»

Afinal, nós, os SPORTINGUISTAS, teremos razão quando dizemos: somos diferentes...

Sammy, o paquete disse...

O meu avô deliciava-se com estas afirmações em que o seu benfiquismo atingia os píncaros da lua e a mim faziam-me sorrir e esta, e outras afirmações, recordo-as com uma nostalgia saudável e saudosa, algo que marcou o meu tempo de criança e adolescente.

Seve disse...

E que saudável era esta deliciosa rivalidade!

Comparando com os tempos que correm apenas me apetece dizer que, na natureza, nada se perde mas tudo se transforma.