sexta-feira, 8 de outubro de 2021

CONVERSANDO


 No Corpo Visível do Mário Cesariny, eslão lá estes versos: o moço que há uma hora não fazia senão fumar cigarros, o mesmo que julgou ter a noite perdida, que maçada, sempre encontrou o seu par, lá vão eles já no extremo do outro lado da praça

e também há aquele outro poema

Em todas as ruas te encontro

em todas as ruas te perco

conheço tão bem o teu corpo

sonhei tanto a tua figura

que é de olhos fechados que eu ando

a limitar a tua altura

e bebo a água e sorvo o ar

que te atravessou a cintura

tanto, tão perto, tão real

que o meu corpo se transfigura

e toca o seu próprio elemento

num corpo que já não é seu

num rio que desapareceu

onde um braço teu me procura

O Manuel António Pina, na morte do poeta (26 de Novembro do ano de 2006), disse que o Cesariny tinha vivido como quem aproveita uma oportunidade única e sabíamos do seu fascínio por marinheiros e várias vezes foi preso pela polícia de costumes o que, segundo Luiz Pacheco deitaram-no muito abaixo, ele tinha de ir todos os meses ao Torel, à apresentação, uma imposição muito chata, se faltava prendiam-no.

2 comentários:

Luis Eme disse...

Fala-se pouco disso, mas deve ter sido uma das maiores vitimas de discriminação sexual no nosso país...

Mas resistiu sempre, sem ter de inventar um casamento ou de esconder-se no armário, Sammy.

Sammy, o paquete disse...

Penso que sim, Luís.
Aliás a nossa cultura está repleta de casos como o Cesariny, uns conhecidos, outros nem por isso. Perdido, lá muito para trás no tempo, tempos tão terríveis..., está o caso do António Botto e só a coragem de José Carlos Ary dos Santos, levou o Partido, «chamando as coisas pelos nomes que elas são» a fechar os olhos a algo para o qual nunca foi NADA claro, apenas fecharam os olhos...