sábado, 12 de novembro de 2011

SARAMAGUEANDO



Há vinte anos ocorria o massacre de Santa Cruz, que mostrou ao mundo, o drama de Timor.

Mais de 200 pessoas morreram.

A 6 de Dezembro de 1975, o presidente dos Estados Unidos Gerald Ford e o seu secretário de estado, Henry Kissinger, de visita a Djacarta, deram o seu consentimento ao presidente Suharto para  a Indonésia invadisse Timor, e advertiram Suharto:

É importante que o que venha a acontecer tenha um sucesso rápido. Seria melhor que fosse feito depois de regressarmos.

No dia seguinte a Indonésia invadiu Timor, interrompendo o processo de descolonização.

Começava então uma longa e dura luta pela independência.

A 30 de Agosto de 1999, 80% do povo timorense, em referendo promovido pelas Nações Unidas, pronunciava-se pela independência de Timor, mas as tropas indonésias, apesar da presença das forças das Nações Unidas, não acataram a decisão e continuaram a perseguir e a matar timorenses.

9 de Setembro de 1999, 6º dia do genocídio em Timor Lorosae, José Saramago publicava, simultaneamente no Público, no Le Monde e em La Repibblica, um artigo de opinião em que interrogava: Que se Passa com o Ser Humano?

Em 20 de Maio de 2002 nascia a República Democrática de Timor-Leste, o nascimento o primeiro país do século XXI.

Hoje é o país mais pobre da Ásia, e um dos 20 mais pobres do mundo.


José Saramago:

 Que importa ao mundo que eu me sinta humilhado e ofendido? Que importa ao mundo que eu tenha chorado lágrimas de indignação impotente perante as imagens infames de um crime infame?

 Se esta desgraçada humanidade, faltando uma vez mais ao respeito que deve a si mesma, não impôs à Indonésia, em nome da simples moral, o acatamento imediato e incondicional da vontade do povo de Timor Leste, que importa que um escritor acuda agora a protestar usando as palavras de toda a gente, que demasiados calam porque estão mais preocupados com os seus interesses no presente e no futuro do que com o sangue que corre e as vidas que se perdem?

 Quanto pesa o povo de Timor Leste nas balanças políticas da China e da Rússia? Qual é a cotização de um habitante de Dili na bolsa de Nova York? A Indonésia tem mais de 3.000 ilhas e Timor Leste é apenas metade de uma delas. Valerá a pena, por tão pouco, levantar-se o mundo para reclamar responsabilidades aos culpados diretos e indiretos das atrocidades que diante dos nossos olhos se cometem, para exigir o castigo dos assassinos e dos seus mandantes? Quanto é preciso, então, para que nos levantemos? Um continente? Dois continentes?

 Levantar-se-á o mundo quando já estiver a ponto de perder-se o mundo? Que se passa com o ser humano? E a democracia, para que tem servido?
Serviu de alguma coisa em Timor? Faz-se um referendo para logo o negar, antes mesmo que os votos estejam contados? Não será um crime contra a dignidade e a honra desprezar e violentar a vontade de independência de um povo? E que sentido tem hoje aquelas palavras? Há honra num ministro, há dignidade num general, se são o general e o ministro que armam o braço dos criminosos? Ou são eles próprios os criminosos?

Quando se porá fim ao cinismo da mal denominada comunidade internacional? Quando acabará a hipocrisia dos que mandam? E a inércia dos que são mandados, quando acabará? Quando deixaremos de chorar sobre nós próprios? Quando deixaremos de dizer que não temos culpa?

Não se salve Timor, e nós não teremos salvação.

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