sábado, 16 de janeiro de 2021

AS MULHERES DE SÁBADO


                                                                   Ao Urbano Tavares Rodrigues

Possuirei as mulheres de sábado.

O amor começa nesse dia,

o mundo acaba nesse dia

lembrando-me de sábado gastarei a semana.

 

Possuirei as livres mulheres de sábado,

as agrestes mulheres que perfumam as ruas,

as que trazem no corpo a Primavera,

as que serenamente, respiram alegria.

 

Amarei nos cinemas as mulheres de sábado,

beijá-las-ei em todos os bares.

Esquecer-me-ei que resisti seis dias

para as ter nos meus braços.

 

Com as sabáticas mulheres

descobrirei jardins novos à cidade,

despedir-me-ei, sorrindo, dos eléctricos,

dos livros, dos cafés, das lojas semanais.

 

Deixarei sobre a mesa os cigarros.

Os inacabados poemas,

os tristíssimos lenços

que me acompanharam de domingo a sexta.

 

Beberei cerveja, tomarei champanhe

nas bocas abertas das mulheres de sábado.

Nadarei, feliz, com as doces mulheres,

falarei apenas de coisas bem fáceis.

 

Ou nem falaremos para não erguer

as sombras pesadas de toda a semana.

comeremos frutos, deitados na areia

sem olhar estrelas nem nuvens longínquas.

 

Sem esforço destruiremos o mundo,

triste pobre mundo dos homens reais.

e, amando-nos, sonharemos que o domingo

não virá nunca mais.

 

António Rebordão Navarro

2 comentários:

Luis Eme disse...

Belo poema!

(como wu gosto de descobrir poemas que desconheço por aqui, Sammy)

Sammy, o paquete disse...

Pela casa há poetas a que chamo vagabundos, porque não possuo qualquer livro, mas estão reunidos em antologias ou aparecem em recortes de jornais, quando havia suplementos literários.
Um dia, tão longe esse dia, numa viagem, de trabalho ao Porto, encontrei num alfarrabista seis volumes (a colecção são nove) das «Notícias do Bloqueio». António Rebordão Navarro, juntamente com Egito Gonçalves, Daniel Filipe, Papiniano Carlos, Luís Veiga Leitão, fazia parte da direcção literária. Uma voz límpida dos cafés do Porto, «a mesma voz que fala à namorada, que diz poemas e pede o bilhete nos eléctricos».
Tem um poema lindíssimo, na antologia de Poesia do Pós Guerra, «Carta do