sexta-feira, 22 de janeiro de 2021

OLHAR AS CAPAS


A Selva

Ferreira de Castro

Livraria Editora Guimarães, Lisboa 1954

 

Sêco e vendido na cidadezita mais próxima o que sobejava da papança quotidiana, com o produto o cabôclo adquiria sal, farinha e cachaça – e emquanto durasse a fortuna vivia feliz e não voltava a trabalhar. A cachaça, para uso diário, e um baile, de quando em quando, para desentorpecer as pernas, em qualquer barraca das margens, constituíam as suas únicas aspirações.

O resto era solidão profunda, uma vida encastoada na selva, alheia a todas as inquietações do mundo, uma vida tão aparte, tão obscura e ignorada, que se ficava a pensar num romance de misantropos que, contudo, não existia.

Quando um navio passava à vista, a família inteira vinha especar-se no cimo do barranco, a admirar o fugitivo sintoma da civilização, emquanto um dos garotos descia a segurar a canôa, não fôssem as ondas desprende-la e a corrente arrastá-la, de «bubuia», rio abaixo.

Sem comentários: