sábado, 3 de setembro de 2022

O OUTRO LADO DAS CAPAS


 A contra capa de A Obra ao Negro é simples, mas forte e colocada.

Chamam-lhe obra-prima e repetem os nomes dos tradutores. Difícil encontrar um nível como este para a tradução da obra de Yourcenar.

No posfácio que escreveu para o livro, Yourcenar adianta o significado do título:

«A fórmula A Obra ao Negro, que dá o título a este livro, designa, nos tratados alquímicos, a fase de separação e dissolução, que era, diz-se, a parte mais difícil da Grande Obra. É ainda discutível se uma tal expressão se aplicava a audaciosas experiências sobre a própria matéria, ou se significava simbolicamente as provações do espírito ao libertar-se de rotinas e ideias feitas. Significou, sem dúvida, uma coisa e outra, distinta ou simultaneamente.»

O mote da narrativa é também dado com a autora a introduzir a epígrafe de Pico della Mirandola:

«Não te dei, ó Adão nem rosto nem lugar que te seja próprio,nem qualquer dom particular, para que teu rosto, teu lugar e teus dons os desejes, os conquistes e sejas tu mesmo a possuí-los. Mas tu, que não conheces qualquer limite, só mercê do teu arbítrio, em cuja mãos te coloquei, te defines a ti próprio. Coloquei-te no centro do mundo para que melhor pudesses contemplar o que o mundo contém. Não te fiz nem celeste nem terrestre, nem mortal nem imortal, para que tu, livremente, tal como um bom pintor ou hábil escultor, dês acabadamente a forma que te é própria.»

Em 1999 o jornal Le Monde, constituiu uma lista de 100 livros considerados como os melhores do século XX. A lista foi elaborada por livreiros e jornalistas em que 17.800 leitores responderam à pergunta: «Que livros ficaram na sua memória».

Esta obra de Marguerite Yourcenar ficou no 26º lugar.

Zenão regressa a Bruges. Não podia correr o risco de ser reconhecido mas a velha Greete conhecia-o desde miúdo.

«Greete vinha quase todas as semanas tratar das suas mazelas de velha, sem nunca deixar de trazer um presente, manteiga embrulhada numa folha de couve, um bocado de bolo feito por ela, açúcar cristalizado ou uma mão-cheia de castanhas. Enquanto comia, ela contemplava-o com aqueles seus olhos risonhos. Havia entre eles a intimidade de um segredo bem guardado.

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