quarta-feira, 19 de dezembro de 2018

UM CANTINHO BOM DO ANO


O Natal será sempre o encanto e a ternura da impossibilidade.

O sem sentido de alguns presentes, como naquele conto de O’ Henry: ela vendeu o lindo e comprido cabelo para lhe comprar uma corrente para o relógio, de que ele tanto gostava; ele empenhara o relógio para lhe comprar as travessas, de que ela tanto gostava, para colocar no cabelo.

Karl Valentim preferia que cortássemos do calendário o Dia De Natal, se com isso conseguíssemos que os restantes 364 dias do ano fossem todos de Natal.

Gostaria que o Natal não tivesse o carácter de que se tem revestido nos últimos anos: um consumismo desenfreado que dele fazem o dia mundial da hipocrisia.

As noites de Natal, aquelas que não mais posso repetir, passava-as em casa do meu pai, a família mais chegada, a comer bacalhau cosido com couves, a beber vinho tinto alentejano, a conversar pela noite fora, rematando-se a festa com carne de porco frita envolta em ovos mexidos, a que se seguiam os doces, umas fatias douradas, filhós e uns cálices de licor de ginja que, por Junho, se tinha colocado a marinar numa grande garrafa de vidro, juntamente com açúcar, aguardente branca, um pau de canela.

A manhã começava a nascer, saía para regressar onde vivia e gostava do cheiro de Natal que sentia pelas ruas.

Tentamos fazer o mesmo com os filhos, alcançar a reinvenção dessas noites felizes, mas é mais que certo: nunca se volta aos sítios onde fomos felizes.

Falta, essencialmente, esse passe de mágica, que eram as conversas do meu pai, um brilhante contador de histórias.

Há coisa melhor que o Natal?

Há: os amigos!

E que mais podemos querer do que um amigo para nos acender o dia, e que esse dia seja Natal?

O Natal é um cantinho bom do ano, um aconchego.

Texto de Gin-Tonic

Legenda: Desenho de Alfredo Morais

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