quarta-feira, 3 de julho de 2024

SONETO DE CAMÕES

                         Car j’imite...Toit le monde imite,
                          Tout le monde ne dit pas.


                                                            Aragon

Que me quereis, perpétuas saudades?
 Com que esperança inda me enganais?
 Que o tempo que se vai não torna mais,
 E se torna, não tornam as idades.

 Razão é já, ó anos, que vos vades,
 Porque estes tão ligeiros que passais,
 Nem todos pera um gosto são iguais,
 Nem sempre são conformes as vontades.

 Aquilo a que já quis é tão mudado,
 Que quase é outra cousa, porque os dias
 Têm o primeiro gosto já danado.

 Esperanças de novas alegrias
 Não mas deixa a Fortuna e o Tempo errado,
 Que do contentamento são espias.

Carlos de Oliveira de Terra da Harmonia em Poesias

terça-feira, 2 de julho de 2024

MÚSICA PELA MANHÃ


Esse extraordinário disco de Fausto que dá pelo nome de «Por Este Rio Acima», tem em apêndice um «Diário de Viagem» das viagens de Fernão Mendes Pinto onde Fausto se baseou para as letras das canções.

Como a imagem que acima se reproduz não é muito nítida, faz-se a  o tea transcrição que pertence a «Peregrinação» de Fernão Mendes Pinto e que deu origem a «Porque Não Me Vês»:

 «O meu desejo  seria sair desta  viagem muito  rico em pouco  tempo sem

pensar quão arriscada eu então levaria a vida,  confiado nesta promessa

e enganado  nesta  esperança.  Na cidade de  Diu, preparava-se  então a

guerra por suspeita que se tinha da vinda da armada do turco.  Parti de

Portugal  na primavera  e,  navegando  todos os  barcos  pela sua rota,

cheguei ao mar da outra banda do oceano. A Índia.»

 

E este é o poema:

 

«Meu amor adeus 
Tem cuidado 
Se a dor é um espinho 
Que espeta sozinho 
Do outro lado 
Meu bem desvairado 
Tão aflito 
Se a dor é um dó 
Que desfaz o nó 
E desata um grito 
Um mau olhado 
Um mal pecado 
E a saudade é uma espera 
É uma aflição 
Se é Primavera 
É um fim de Outono 
Um tempo morno 
É quase Verão 
Em pleno Inverno 
É um abandono 
Porque não me vês 
Maresia 
Se a dor é um ciúme 
Que espalha um perfume 
Que me agonia 
Vem me ver amor 
De mansinho 
Se a dor é um mar 
Louco a transbordar 
Noutro caminho 
Quase a espraiar 
Quase a afundar 
E a saudade é uma espera 
É uma aflição 
Se é Primavera 
É um fim de Outono 
Um tempo morno 
É quase Verão 
Em pleno Inverno 
É um abandono

Porque não me vês

Meu amor adeus

Tem cuidado

Se a dor é um espinho

Que espeta sózinho

Do outro lado

Meu bem desvairado

Tão aflito

Se a dor é um dó

Que desfaz o nó

E desata um grito

Um mau olhado

Um mal pecado

E a saudade é uma espera

É uma aflição

Se é Primavera

É um fim de Outono

Um tempo morno

É quase Verão

Em pleno Inverno

É um abandono

Porque não me vês

Maresia

Se a dor é um ciúme

Que espalha um perfume

Que me agonia

Vem me ver amor

De mansinho

Se a dor é um mar

Louco a transbordar

Noutro caminho

Quase a espraiar

Quase a afundar

E a saudade é uma espera

É uma aflição

Se é Primavera

É um fim de Outono

Um tempo morno

É quase Verão

Em pleno Inverno

É um abandono»

 

 E esta é a canção:


segunda-feira, 1 de julho de 2024

POSTAIS SEM SELO


«O barco vai de saída, adeus ó cais de Alfama, meu amor adeus, tem cuidado se a dor é um espinho, por mais que seja santa, a guerra é a guerra, o escuro é muito grande, o tempo é mais frio, o mar é muito grosso, como se a terra corresse inteirinha atrás de mim, olhamos tudo em silêncio na linha da praia, vai de roda quem quiser e diga o que tem a dizer, e na verdade o que vos dói, é que não queremos ser heróis, a terra a navegar meu bem como eu vou por este rio acima, abranda Senhor a pena dos mortos, p’ra que te louvem com sono quieto, os anais do grande general chamado o «galego, o homem dos olhares fatais, navegar navegar ó minha cana verde, mergulhar no teu corpo entre quatro paredes, ó mar leva tudo o que a vida me deu, tudo aquilo que o tempo esqueceu, lembra-me um sonho lindo, quando ás vezes ponho diante dos olhos a lusitana viagem, medonha, que eu dobrei, os tormentos passados,  e os fados que chorei.»

Fausto, versos soltos tirados de Por Este Rio Acima                       

NOTÍCIAS DO CIRCO

Os canais televisivos de  notícias despacharam a notícia da morte de Fausto em 5/10 segundos.

O resto do noticiário estendeu-se durante largos minutos pelo futebol, pelo jogo da selecção logo à noite, em Frankfurt, para o Euro 2024.

Ainda lá estão com os adeptos à porta do Hotel para incentivar os jogadores a repetirem as frases patrióticas de sempre, que vamos ganhar e o Ronaldo, finalmente, vai marcar.

Há dias colocámos num «Postal Sem Selo», uma velha frase do Filipe Vicente:

Acabaram com a agricultura, com o tintol a martelo, com as morcelas caseiras, com o tabaco nos restaurantes, com o escudo, com a frota pesqueira, com o Aquilino nas escolas, com a tropa obrigatória. Agora espantam-se porque o povo só se sente patriota com a selecção? Pensassem nisso antes.

Em tempo:

Nas lamentações várias da morte do Fausto, refere-se outros cantoautores como José Mário Branco, José Afonso, Sérgio Godinho, nunca o Adriano Correia de Oliveira.

Veja-se o site da Presidência da República («Fausto pertencia a uma constelação de músicos que traduziu para as canções de intervenção o sentimento do povo português, e é por isso inevitável associar o nome de Fausto aos nomes maiores da música portuguesa, como José Afonso, José Mário Branco ou Sérgio Godinho.»).

FAUSTO BORDALO DIAS (1948-2024)

                    

Morte de Fausto Bordalo Dias, cantor genial músico e poeta.

Ainda há muito pouco tempo andou connosco nas Viagens de Abril. 

E vai continuar.

MAIAKOVSKI

Aos trinta e seis anos

um tiro ao coração.

Assim

crucificaste

este século.

 

Emigrante

doutro tempo,

acertaste

onde era preciso

tocar,

pôr as mãos,

encontrar o futuro,

Maiakovski.

 

De A Raiz Afectuosa em António Osório