sábado, 20 de dezembro de 2025

OLHAR AS CAPAS


 O Passado Remoto

Giovanni Papini

Tradução: Armandina Puga

Colecção: Livros RTP nº 27

Editorial Verbo, Lisboa s/d

Nunca vi Paris tão jubilosamente inundada de sol e de inteligência como na Primavera de 1914. Parecia que a velha Europa, antes de se envolver no manto de fogo e de luto, quisera oferecer a si própria uma última course aux flambeaux, num dos seus mais famosos boulevards.

O tempo estava quase sempre bonito, o céu tinha a amenidade perlada do mais cordial setentrião, a gente parecia contente de viver, e de viver precisamente naquela germinante estação. Nas árvores, que se erguiam entre as fortalezas burguesas dos grandes palácios negros, despontavam as primeiras folhas, a despeito do ar que cheirava a gasolina e a asfalto ainda húmido.

Por toda a parte reinava uma vida alacridade, uma temeridade de experiências, uma vontade de tentar e ir mais além que dava alma e coragem aos mais ensonados, esperanças e embriaguez  aos mais arrojados aventureiros. Por toda a parte se falava em teorias novas, nasciam novas revistas, abriam-se novas exposições, novos poetas e pintores se revelavam. Parecia o festim de Alexandre, antes do incêndio da Babilónia.

Fora até lá com Soffici e Carrà. Também Marinetti e Palazzeschi vieram por uns dias. Mais do que nunca Paris era a Alexandria da cultura moderna, onde convergiam homens vindos de toda a Europa. Os pintores mais famosos chamavam-se Picasso e Juan Gris, Modigliani e Van Dongen; os escultores mais célebres, Rosso e Archipenko; e também os escritores acorriam de toda a Europa.

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