quinta-feira, 26 de agosto de 2010

SÃO CARACÓIS, SÃO CARACOLITOS

A “saison”dos caracóis está a chegar ao fim.

Dizem, os entendidos, que os melhores caracóis de Lisboa são os do “Filho do Menino Julio dos Caracóis”: os caracóis são lavados de um dia para o outro, ficam trinta minutos a coser em lume brando, junta-se-lhe cebola, alho e sal e o resto do tempero e é aqui que reside o segredo da casa, a chave que só a gente de confiança do Filho do Menino Julho, sabe como se roda.

Não sendo os caracóis a minha chávena de chá, apenas os petisco, com o fim de acompanhar uns fininhos, uma garrafa de branco.

“O Filho do Menino Júlio dos Caracóis”, Vasco Rodrigues de seu nome, é um sportinguista de todos os costados, e. como tal, rodeou a sala de mastigação com enormes painéis fotográficos que são as bancadas do Estádio Alvalade XXI.


Os benfiquistas, e não só, diziam de si para si que, se para o outro Paris valia bem uma missa, os caracóis do “Filho do Menino Júlio dos Caracóis” mereciam o sacrifício de estar por ali a comê-los rodeado pelas bancadas de Alvalade.

Acontece que o negócio cresceu desalmadamente e o “Filho do Menino Júlio dos Caracóis” , para corresponder às exigências, viu-se na necessidade de comprar o estabelecimento ao lado para alargar as instalações. Mas ao fazê-lo, retirou parte dos painéis do “Alvalade XXI” para os colocar na nova sala. Eu, que até sou benfiquista, terei que dizer que o “Filho do Menino Júlio dos Caracóis” deu um tiro no pé. Não na conta bancária, of course, mas a casa perdeu toda a graça, aquele “kitsch” que lhe ficava a matar.

Acresce que os caracóis já não têm a qualidade de outros tempos. Talvez o assassínio da decoração tenha a ver com tudo isso. Ou, recorrendo de novo aos especialistas, há a dizer que os caracóis perderam qualidade, porque são importados de Marrocos.

É esta a triste sina, de, todos os dias, assistirmos à destruição do que de típico, de diferente, as tascas de Lisboa possuíam. Não aparecemos durante uns tempos e quando se regressa, já nada é como era…
Coisas da globalização, ou lá o que lhe quiserem chamar…

Pela parte que me toca, faço “requiem” aos caracóis do “Filho do Menino Júlio dos Caracóis". Só lá voltarei quando for reposta a legalidadade, quando as bancadas do “Alvalade XXI” voltarem a rodear a antiga sala.

E para finalizar a prosa, com uma grande chapelada ao Hélder Pinho, vou aos “Textos Locais” do Luiz Pacheco sacar este delicioso pedacinho:

“Mas nem tudo são desgraças: eis que me trazem caracóis. É o meu puto um velhaco de quatro anos que foge de casa manhã cedo e por lá se governa todo o dia sei lá como, que traz caracóis para o velho abade do Pai. Caracóis, sabeis, é comida de sustância, peitoral, faz (dizem) tesão.”

Legenda: “O Filho do Menino Júlio dos Caracóis”, Rua Vale Formoso de Cima nº 140.

1 comentário:

filhote disse...

Aliás, tal como os caracóis, o Sporting já não é o que era...