terça-feira, 4 de janeiro de 2011

SARAMAGUEANDO



Apenas com um livro publicado, “Os Poemas Possíveis”, Julho 1966, não sendo por esse tempo, alguém que tivesse chamado especiais atenções, José Saramago começou a ver alguns dos seus poemas musicados. Luís Cilia, nos três volumes de “La Poésie Portugaise de Nos Jours e de Toujours” e Manuel Freire, foram os que mais se distinguiram.

Por ocasião do 25º aniversário do 25 de Abril, a Editorial Caminho publicou este CD “As Canções Possíveis”:

“Estes poemas foram palavras caladas. Um dia longínquo (vai para trinta anos ou já os fez) Luís Cilia, lá no seu exílio em França, deu música e voz a algumas delas.
Depois no árido exílio interior, Pedro Barroso fez cantar Afrodite. E logo Manuel Freire se veio sentar a seu lado para ouvir Beethoven e pôr na boca do Velho do Restelo ditos que eram obra de razão.”

“Ouvindo Beethoven”, musicado por Manuel Freire em 1973, anuncia que o dia das surpresas estava para chegar:

"Venham leis e homens de balanças,
mandamentos d'aquém e d'além mundo.
Venham ordens, decretos e vinganças,
desça em nós o juízo até ao fundo.

Nos cruzamentos todos da cidade
a luz vermelha brilhe inquisidora,
risquem no chão os dentes da vaidade
e mandem que os lavemos a vassoura.

A quantas mãos existam peçam dedos
para sujar nas fichas dos arquivos.
Não respeitem mistérios nem segredos
que é natural os homens serem esquivos.

Ponham livros de ponto em toda a parte,
relógios a marcar a hora exacta.
Não aceitem nem queiram outra arte
que a prosa de registo, o verso acta.

Mas quando nos julgarem bem seguros,
cercados de bastões e fortalezas,
hão-de ruir em estrondo os altos muros
e chegará o dia das surpresas."

 “As Canções Possíveis” foi uma cortesia natalícia de Luís Pinheiro de Almeida.

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