sábado, 29 de janeiro de 2011

A BOLA

         

Em 29 de Janeiro de 1945, Cândido de Oliveira fundou o jornal A Bola.

Já lhe chamaram, Bíblia, também o Avante da Travessa da Queimada.

O jornalismo de sarjeta que por aí se faz, também atacou o jornal. 

Desaparecidos os jornalistas, notáveis cronistas, diga-se, que lhe deram glamour, hoje não passa de um produto amorfo, sem qualquer ponta de brilho, que aposta no sensacionalismo para vender papel.

 A Bola tem a minha idade e poderei dizer que foi no jornal do Cândido, como o meu avô lhe chamava, que soletrei as primeiras letras e, sem exagero, gosto de dizer que aprendi a ler com A Bola.

Quando o jornal fez 43 anos, convidou algumas personalidades para se pronunciarem sobre a efeméride. O cineasta João César Monteiro foi uma dessas personalidades:

 «Se não estou em erro, sou ledor de “A Bola” há mais de trinta anos. Do tempo em que era quase afrontoso ser visto com “ela” debaixo do braço e nem sempre se ousava confessar o pecadilho que era gostar de a ler. Para restituir a boa consciência a esse perverso apetite, criou-se um álibi curioso. “A Bola” passou a ser, antes do mais, um modelo de virtudes prosódicas, uma escola de bem escrever jornalístico. Com alguma razão, diga-se, se fecharmos piedosamente os olhos a certas piroseiras metafóricas que, de onde em onde, ensombram com a má literatura o bom jornalismo.
Para ser franco e sem cair no pretensiosismo de ter mais em que pensar, nunca pensei muito n’”A Bola”. Passo os olhos por ela, deixo-a deliberadamente na mesa do café, encontro-lhe utilidades culinárias para embrulhar tachos com arroz ou para absorver o óleo dos carapaus fritos. Numa ou noutra aflição, já me tem valido, com todos os inconvenientes de estampagem de aí decorrente. Nada de grave: conheço letrados bem piores.»


A Bola
 que hoje corre por aí, com o mesmo nome, não tem nada a ver com o jornal do Cândido.


Foi, até certa altura, um jornal bem feito, interessante mas não ao ponto de, com uma grande dose de exagero e injustiça, Carlos Pinhão ter afirmado, em pleno salazarismo/marcelismo, que «o jornalismo desportivo era o melhor jornalismo português». Carlos Pinhão esquecia-se (?) que A Bola não ia à “Comissão de Censura”. Os outros, seus camaradas de profissão tinham de escrever nas entrelinhas para tentarem fazer um jornalismo minimamente honesto.

À velha A Bola devo o facto de Ruy Belo ser um poeta do meu panteão.

O meu conhecimento com Ruy Belo não começou nem pelos livros, nem pelos poemas, mas por uns artigos sobre futebol que, nos idos de 1972, publicou em A Bola. 

Gostei tanto desses artigos que me interessei logo na procura de coisas acerca de Ruy Belo. 

Acabei a comprar-lhe os livros. O primeiro foi Homem de Palavra(s), uma capa azul, um belo livro. 

Lembrar Herberto Helder: «mais do que dizer que gostei dos livros de Ruy Belo, gostaria de escrever que os acho fundamentais».

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