segunda-feira, 29 de julho de 2013

A LENDA DE EL-REI SEBASTIÃO


Pelos idos de 67, o Em Órbita lançou um convite aos ouvintes para que, por escrito, enviassem ideias e que outras músicas entendiam deviam ser passadas no programa.

O prémio consistia numa visita aos estúdios da Sampaio e Pina para presenciar, in loco, a realização do programa feito por nós e dito por mim.

Por esses tempos, andava eu enredado na música brasileira, esperar não é saber, quem sabe faz a hora não espera acontecer, contestação para um lado, Chico Buarque para o outro, pelo meio Gilberto Gil, Nara Leão, Caetano.

Esgalhei um arrazoado sobre essas músicas.

 Os rapazes gostaram e, nessa semana, mandaram-me aparecer por lá.

Lamentavelmente, perdi esse texto, batido à máquina, na minha velha Erika, que ainda está por aqui, como peça de museu.

Foi um belo pedaço de fim de tarde e até calhei num dia em que o alinhamento não tinha sido feito, os LPs foram saindo do armário colocados à papo seco, mas tudo aquilo eram grandes canções e, enquanto os discos rodavam o Cândido Mota, com aquele seu ar bem disposto, profissional de mão cheia, ia colocando os discos e mostrava-me o último relógio de pulso que adquirira para a sua larga colecção.

Como convidado, alinhei na votação dos melhores discos da semana. Tinha que escolher cinco mas, hoje, apenas me recordo de Dedicated To One I Love dos The Mamas and The Papas e o White Rabit dos Jefferson Airplane.

Disseram-me que aparecesse quando quisesse e assim foi acontecendo.

Com o João Manuel Alexandre nasceram laços de estima e consideração.

Numa das conversas com o João, veio à baila a ideia que existia na equipa para apresentar canções de artistas portuguesas, mas as dificuldades eram muitas, a maior delas a obrigatoriedade de não fugir à qualidade do programa.

Falei-lhe, então, do Adriano Correia de Oliveira, que nesse sábado iria realizar  uma sessão de canto (ainda não) livre, na Baixa da Banheira, em que também participavam o Carlos Paredes e o José Carlos de Vasconcelos.

Acertámos em ir falar com o Adriano.

Assistimos ao concerto, alinhámos no convívio no bar da Sociedade, muita conversa, uns queijinhos frescos, jarros de vinho tinto e aguardar o tempo para uma conversa serena com o Adriano.

Só que o Adriano era a imprevisibilidade em pessoa e no meio de tudo aquilo apareceu o escritor António Borga a dizer à malta que o Fernando Lopes Graça estava num fogo de campo na Costa da Caparica com o coro da Academia dos Amadores de Música e foi a debandada quase geral. O Adriano esqueceu a conversa.

Nada havia a fazer.

Eu, o João e a mulher regressámos a Lisboa no seu Carocha.

Não houve mais oportunidade de voltar ao assunto.
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Poucas semanas depois dessa noite de sábado na Baixa da Banheira, assentei praça em Tavira.

Para ser preciso no dia 10 de Julho de 1967.

O Em Órbita não chegava à caserna do CISMI.

No dia 29 de Julho de 1967 o Em Órbita passava A Lenda de El-Rei D. Sebastião do Quarteto 1111.

Cândido Mota dixit:

É o sebastianismo colectivo que na lenda se retrata, a ideologia negativista dos que se alimentam da crença irracional em coisas, em valores, em poderes que não existem, dos que se deixam enganar pelos falsos Messias do oportunismo e da mistificação.

Uma tentativa honesta e inédita de lançamento das bases de uma música popular portuguesa que todos nós, em boa consciência, queremos renovada por inteira.

Temos para nós que o trecho que vamos apresentar preenche os requisitos mínimos para a sua divulgação por este programa, com todas as implicações que a sua transmissão através de "Em Órbita" acarretam.

Tendo por título "A Lenda De El-Rei D. Sebastião", é escrito por um português tocado e cantado por portugueses.

Vamos apontar o que nela se nos afigura existir de importante e de novo, focando em especial os aspectos puramente interpretativos, instrumentais e vocais.

O que neste trecho impressiona mais, o que nele se inclui de mais nitidamente inédito é que, em cima de uma melodia de encantadora simplicidade, há uma história singela, popular, portuguesa, dita em versos directos, certeiros, desenfeitados.

Conta-se uma lenda. Como lenda que é, trazida até hoje pela herança popular, pertence ao folclore, ao património mais íntimo da comunidade e dos costumes do nosso país.

É um tema eterno, de criação nacional e de validade perene e universal.

Nunca soube de como se chegou ao Quarteto 1111.

Uma coisa é certa: até hoje, não consegui digerir a escolha.

Legenda: a capa do disco aparece aqui por cortesia de Mr. Ié-Ié.

1 comentário:

ié-ié disse...

Boa história! Desconhecia!Também cheguei a conhecer o João Manuel Alexandre!

LT