domingo, 30 de agosto de 2015

QUOTIDIANOS


Não nos espantemos, de resto. Que isto se desse com Guida, não tinha nada de especial. Especial porquê? O falar alto, só para si, é um excitante intelectual, um devaneio dos solitários, sonho ou vingança. Tecem diálogos ao espelho das burguesinhas das vilas, fala o cego para o surdo sobre o mundo que os rodeia. Canta o galo capado, poucos o entendem. E poetas há, nas Caixas de Previdência, que vagueiam alta noite pelas ruas da Baixa, esmiuçando conversas de sua imaginação.
É natural. Vivemos numa época em que cada qual fala para si mesmo na companhia de muitos outros.

José Cardoso Pires em O Anjo Ancorado

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