A Conquista da Felicidade
Bertrand Russell
Tradução: José
António Malheiro
Guimarães
Editores, Lisboa, Janeiro de 1957
Todos os grandes livros contêm passagens aborrecidas e
em todas as grandes vidas houve períodos pouco interessantes. Imaginai um
moderno editor americano a quem lhe levassem o Velho Testamento como um
manuscrito novo para ser publicado pela primeira vez. Não é difícil adivinhar
quais seriam os seus comentários a respeito, por exemplo, das genealogias: «Meu
caro senhor, diria, a este capítulo falta animação; não pode esperar que os
leitores se interessem por uma simples lista de nomes próprios de pessoas sobre
as quais lhes diz tão pouco. Reconheço que começou a sua história num belo
estilo e no princípio eu estava muito favoravelmente impressionado, mas
verifiquei que tem um desejo excessivo de dizer tudo. Escolha as passagens mais
claras e importantes, elimine as supérfluas e volte a trazer-me o manuscrito
quando tiver reduzido a uma extensão razoável.» Assim falaria um editor moderno
que conhecesse o medo que os leitores têm de se aborrecer. Diria o mesmo a
respeito das obras clássicas de Confúcio, do Alcorão, do Capital de Marx e de
todos os outros livros consagrados que provaram ser best-sellers. E isto não se
aplica somente a esses livros. Todos os melhores romances têm passagens
aborrecidas. Um romance brilhante da primeira até à última página é quase certo
que não será um bom livro.
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