Para Sempre
Vergílio
Ferreira
Livraria
Bertrand, Lisboa, Março de 1984
Para sempre. Aqui estou. É uma tarde de Verão, está
quente. Tarde de Agosto. Olho-a em volta, na sufocação do calor, na posse final
do meu destino. E uma comoção abrupta – sê calmo. Na aprendizagem serena do
silêncio. Nada mais terás que aprender? Nada mais. Tu, e a vida que em ti foi
acontecendo. E a que foi acontecendo aos outros – é a História que se diz? abro
a porta do quintal. É um portão desconjuntado, as dobradiças a despegarem-se.
Há muito tempo já que aqui não vinhas. Sandra era da cidade, gostava da
capital, detestava a vida da aldeia. Lá ficou. Abro a porta devagar, ela range
para o espaço do jardim. É um jardim morto, as plantas secas, os canteiros
arrasados nas pedras que os limitavam. Alguns têm só terra ou hastes secas de
roseiras. Vejo-as do portão, o carro à entrada a trabalhar. Depois meto-o na
garagem, que é um barracão ao lado da casa. Um silêncio súbito, silêncio da
terra. Só vozes ermas dos campos, ouço-as no calor parado da tarde, Reparo
agora melhor no pequeno jardim. Uma selva bravia. As plantas selvagens
irromperam de todo o lado, aos cantos dos muros à volta, junto à casa. Há
algumas armações de madeira ainda, já apodrecidas, suspensas de arames, sem
flores. Olho-o um instante, olho a casa, circunvago o olhar. Preparar o futuro –
o futuro… E uma súbita ternura não sei porquê. Silêncio. Até ao oculto da tua
comoção. Preparar o futuro, preparação para a morte. Está certo. Parte-se
carregado de coisas, elas vão-se perdendo pelo caminho. Se ao menos uma breve
ideia. Não tenho. Não é bem a vida que faz falta – só aquilo que a faz viver.
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