terça-feira, 26 de janeiro de 2016

O QU'É QUE VAI NO PIOLHO?


Nasci na Mestre António Martins, uma rua situada entre a Avenida General Roçadas e a Rua da Penha de França.

Num espaço abrangente,havia uma larga mão cheia de cinemas: o Royal, o Cine-Oriente, o Max, o Imperial, o Lys, o Rex,

Todos cinemas de reprise, salas populares, com preços acessíveis, direito a ver dois filmes.

O Império era um outro luxo perto das tais avenidas que Salazar pretendia novas para esconder as misérias de outras ruas da cidade.

Cinema de estreia praticava preços acima das posses da malta do bairro.

Só em dias de festa se ia ao Império.

E os dias de festa eram escassissimos.

Mais tarde frequentei-o assiduamente.


Não só pelas estreias que iam acontecendo, também pelas Terças-Feiras Clássicas, e para ver as peças de Teatro que ali foram representadas pelo Teatro Moderno de Lisboa.

Já não falo dos filmes vistos no Estúdio, sala situada no último piso do edifício, com uma soberba vista para a Alameda D. Afonso Henriques, e inaugurada a 29 de Outubro de 1964 com o belíssimo Os Chapéus de Cherburgo.

Do Teatro Moderno de Lisboa, como do Estúdio, haverá, por um destes dias, outras conversas.


Ainda do Cinema Império recordo: juntava-me à concentração na Alameda, para o festejar do primeiro 1º de Maio, quando olho a fachada do Império e vejo cartaz de  O Couraçado de Potemkin.

Jorge Silva Melo, também, cita o pormenor no seu Século Passado:

…é um passeio vazio, sem gente nenhuma a estas horas, nem a sombra da multidão que naquele distante 1º de Maio de 1974 ali descia, pelas três da tarde, e via içarem no Império o cartaz d’ O Couraçado de Potemkin, imagem que não esqueço, vitória, dia de sol e voz clara, tanta gente sem medo e tão feliz.

 O Cinema Império começou a ser construído em 1947, concluído em 1952 e inaugurado em 1955, sendo um projecto de Cassiano Branco.

À entrada, um painel de azulejos de João Fragoso e nos foyer do 1º e 2º Balcão um mural de Luís Dourdil (1º balcão) e pinturas de Frederico George.

Como os cinemas também se abatem, fecharam portas os cinemas de bairro, os velhos «piolhos», onde tanta gente agarrou o gosto pelo cinema.

O mesmo aconteceu ao Império.

As salas de cinema que começaram a surgir nos Centros Comerciais desviaram espectadores e salas, como o Império, passaram a ter os dias contados.

Fechou portas no dia 31 de Dezembro de 1983 e em 1992 o Império passou a ser palco e circo de uma seita-dita-religiosa.

Ainda por lá se encontram.


A seita tentou encerrar o Café Império, de que são proprietários porque compraram todo o edifício, mas movimentações dos trabalhadores e clientes, com o forte apoio da Câmara Municipal, impediram mais um crime-de-lesa-pátria.

O Cinema Império foi inaugurado a 24 de Maio de 1952.

Margarida Acciaiuoli, no seu livro Cinemas de Lisboa, coloca o Império, juntamente com o São Jorge e o Monumental, no capítulo: As Grandes Catedrais.

O filme de estreia foi O Preço da Juventude.

No programa de estreia, as sessões começavam com a exibição de um Jornal de Actualidades, o documentário Madrid eseguia-se um intervalo.

 Um outro intervalo acontecia a meio da exibição do filme.

Os intervalos eram local de encontro e convívio no agradável conforto dos foyers do Cinema.

No topo, reproduz-se a capa do 1º Programa do Cinema Império.

E esta é a apresentação pública:


Legenda:
O programa da inauguração do Cinema Império pertence ao acervo cinematográfico de Luís Miguel Mira.
A fotografia do cartaz do Couraçado Potemkim, na fachada do Império, foi tirada do blogue  À Pala de Walsh.

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