sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

NÃO TE ESQUEÇAS DESTES DIAS


Sempre gostei de Robert Enke.
Pela sua simplicidade, a sua alegria, um miúdo simpático que fazia defesas que maravilhavam.
Porque tenho este feitio de nunca dizer mal dos jogadores do Benfica, para mim, o Enke nunca dava frangos.
Não tardou que começasse a ser pretendido por outros clubes.
Os sócios bem escreveram panos que diziam «Enke fica!», mas acabou por ir para o Barcelona.
Dificilmente se aceita a morte, pior ainda quando sabemos que um jovem de 31 anos, vítima de uma depressão que nunca conseguiu resolver, procura essa morte.
A 10 de Novembro de 2009 Robert Enke procurou um comboio que o levasse da vida.
Comecei a ler Robert Enke, Uma Vida Curta Demais, em Novembro do ano passado.
O que pensava vir a ser uma leitura fácil, tornou-se algo complicada.
Mais de uma vez abandonei o livro e só há poucos dias cheguei ao fim.
Está largamente sublinhado e dificilmente voltarei a pegar nele.
A morte de Robert Enke deixou-me, na altura, um misto de revolta e tristeza.
Não podia ser possível.
Na terça-feira, dia 10 de Novembro de 2009, Robert Enke andou às voltas de carro nas imediações de Empede. Lembrou-se à tarde de que ainda precisava de tratar de uma coisa. Foi a uma estação de serviço e mudou o óleo do carro. Depois atravessou Empede e dirigiu-se à passagem de nível mais próxima, em Eilvese. Apanhava por vezes o comboio para o treino. Porque não haveria um guarda-redes internacional de viajar de comboio? A ligação era boa. Robert conhecia o horário de cor e salteado. Sabia que o expresso regional proveniente de Bremen atravessava Eilvese sem para às 18:15. (pág. 416)
A morte de Robert Enke revelou à maioria de nós quão pouco sabemos acerca dessa doença que é a depressão. As pessoas que a conhecem, em número chocantemente elevado, tomaram subitamente consciência de como é difícil falar sobre a depressão. Tal como Robert Enke, sempre acreditaram que tinham de manter em segredo a sua doença ou a doença de um qualquer familiar. (pág. 10)
Disse um dia a Teresa sua mulher: “Se um dia tu tivesses a minha cabeça durante meia hora, irias percebe perceber porque é que estou a dar em doido.”
Os amigos e os companheiros de equipa dizem que era um homem maravilhoso que acreditava que tinha sempre de procurar o ponto de vista de outras pessoas.
Gostava de cães.
Moreira, seu companheiro no Benfica, diz que apanhava cães rafeiros, abandonados nas ruas, e levava-os para casa.
“Olha lá Moreira”, disse Robert no quarto de hotel. “Como é possível tratarem tão mal aqui.” (pág. 115).
Segundo a mulher, foi em Lisboa que Enke viveu os tempos mais felizes da sua vida e
considerava que José Mourinho tinha sido o melhor treinador da sua carreira.
Robert viajou de férias para Lisboa com Teresa. Tinham entretanto comprado aí uma casa.
“Continuas a querer regressar ao Benfica quando tiveres 34 anos?”, perguntou-lhe Paulo Azevedo.
“Claro”, respondeu Robert. (pág. 327).,
A sua morte impediu esse desejo, bem como o regresso a uma felicidade que já sentira.
Tudo isto me fez procurar um poema com que pudesse homenagear Robert Enke.
Encontrei este, da autoria de António Gedeão:
Uma canção pequenina
Que vem do lado de lá.
Rompe através da cortina
Que envolve o mundo de cá.
Que mais se pode dizer de uma vida curta demais?
Também no diário que manteve durante a depressão, as entradas foram-se torrnado cada vez mais curtas à medida que a doença o atormentava. A última página apresenta uma única frase, em letras enormes. Supostamente deveria ser uma advertência dirigida a si próprio, embora a frase seja lida como um pedido a cada um de nós:
“Não te esqueças destes dias.”

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