sábado, 22 de outubro de 2022

SUBLINHADOS SARAMAGUIANOS



 Dito já que começaram as iniciativas que visam registar o centenário do nascimento de José Saramago, acrescenta-se que irei pegando num qualquer livro de José Saramago e copiarei dele uma frase, um parágrafo, aquilo que constituem os milhares de sublinhados que, ao longo dos muitos anos de leituras, invadiram os livros de José Saramago que habitam a  Biblioteca da Casa.

Momentos Difíceis.

João Marques Lopes publicou em 2010 uma Biografia de José Saramago.

Na revista Visão, Marques Lopes conclui que Saramago, no sentido sartriano, era um «intelectual total» que também escreveu romances e peças de teatro.

«José Saramago era um sobrevivente e um autodidacta mas ao contrário de Jean-Paul Sartre, cresceu em condições económicas difíceis( viveu com os pais em partes de casa, com outras famílias, sem possibilidade sequer de comprar livros) e, já empregado, foi despedido um primeira vez por causa da sua actividade sundical, um amargo de boca que reviveria depois da revolução ao ser saneado do DN. E não passara do antigo 5º ano do liceu, o que na altura era bom embora ficasse aquém dos outros literatos com quem dividia as atenções dos leitores.»

Biografia, página 23:

«Durante o período em que viveu com os pais, até aos vinte e um anos, Saramago passou por dez casas diferentes em Lisboa. Até 1937, quando por fim alugaram um pequeno andar independente no número 11 da Rua Carlos Ribeiro à Penha de França»

Página 30:

«Não foram poucas as vezes, no tempo da adolescência, que ocupei um envergonhado lugar na fila de aspirantes à sopa e ao quarto de pão que se serviam naquele atarracado e soturno edifíciofronteiro à igreja dos Anjos.»

Página 31:

«… a aprendizagem da língua estrangeira haveria de servir para a tradução remunerada de dezenas de livros, ajudando a equilibrar as finanças ou sendo até o único ganha-pão em momentos difíceis. Não eram contrapontos que indicassem propriamente a construção de um escritor, mas prenunciavam um mundo diferente para um jovem com os antecedentes socioecnómicos de Saramago e com comportamentos tão desviantes dos seus meios como o de frequentar a ópera no Teatro Nacional de S. Carlos, para a qual entrava por amizade de um porteiro relacionado com o seu pai a partir de cujo «galinheiro» bem mais ouvia do que via as representações por causa do camarote rela que tapava parte do palco… Algo estava ali em gestação!»

Página 32:

À data, vive ainda com os pais no pequeno andar independente do número 11 da Rua Carlos Ribeiro, à Penha de França. Entre a casa, o emprego e as bibliotecas, o serralheiro mecânico iniciava um tímido processo de mobilidade social. Transitava a amanuense. Estava prestes a comprar os seus primeiros livros – todos da colecção «Cadernos Inquérito», à época instrumento importante de divulgação cultural e generalista – graças ao empréstimo de trezentos escudos feito por um colega de trabalho. E conservava o hábito de frequentar sistematicamente as bibliotecas públicas.»

5 comentários:

Sammy, o paquete disse...

Uma outra história sobre Saramago contada, na revista «Visão» por João Marques Lopes:
«...aquela história muito engraçada em que ele descobriu por acaso o Ricardo Reis na revista «Athena» e pensou que era uma pessoa de carne e osso»

Anónimo disse...

“ao ser saneado do DN”!? a sério, não foi o contrário?

Sammy, o paquete disse...

A frase «saneado do DN» é utilizada pelo historiador Pedro Marques Lopes.
Talvez o mais correcto seria: «despedido do DN», restando saber se com, ou não, justa causa.
O episódio ocorre naquele Verão Quente de 1975.
Muito do que se passou naquele tempo necessita de uma visão desapaixonada que eu nunca terei. Por outro lado a idade que me vai acontecendo já não me permitirá, daqui por uns anos, conhecer outras fontes da história que provavelmente existirão e desconheço.
Saramago disse ainda que o «Caso DN» «é uma das muitas histórias mal contadas deste país» e ao jornalista e amigo José Carlos Vasconcelos, em 1999, contou-a com a pretensão, mas sem grande esperança, que ficasse bem contada.
Claro que é o seu olhar dessa história.

Anónimo disse...

Grato pelo complemento. No entanto, quando refere Pedro Marques Lopes “historiador” de quem se trata?

Sammy, o paquete disse...

João Marques Lopes e não Pedro Marques Lopes, como, por lapso, escrevi na resposta ao seu comentário.
A Wikipédia informa que João Marques Lopes, nascido em Agosto de 1971, é escritor, jornalista e guionista. A editora «Guerra & Paz» coloca na Biografia sobre José Saramago uma nota sobre o autor:
«João Marques Lopes desenvolve, actualmente, trabalhos de doutoramento na área de Literatura Brasileira, pela Faculdade de Letras de Lisboa e em colaboração com a Universidade de Utrecht, na Holanda. Tem publicado biografias sobre Almeida Garrett, Eça de Queiroz e Fernando Pessoa. Colaborou com vários artigos na colecção «Os Anos de Salazar», sempre no âmbito do literatura e cultura portuguesas. É licenciado em Filosofia pela Faculdade de Letras de Lisboa e exerceu actividade docente no Ensino Secundário durante dez anos.