domingo, 29 de junho de 2025

OLHAR AS CAPAS


Nada do Outro Mundo

Antonio Muñoz Molina

Tradução: Cristina Rodriguez e Artur Guerra

Capa: Fernando Mateus sobre fragmento de pintura de Edward Hopper

Relógio d’Água, Lisboa 1994

Foi ontem que os vi, Juana Rosa e Funes. Pensei que podiam vigiar a minha casa. Peguei nalguma roupa, no meu computador portátil e no meu cartão de crédito e fechei-me neste hotel. Na noite passada não dormi, Também não dormirei esta noite, embora me doam muito as costas e tenha os olhos vermelhos por causa do brilho do ecrã co computador. Os dedos movem-se no teclado sem que eu os governe. As palavras surgem no ecrã como se não as escrevesse. É como caminhar e caminhar numa cidade desconhecida e estar morto de cansaço e não parar nunca. Morto: também eles estão e não param. Mas apercebo-me, quase com alívio, de que o fim já não vai demorar. São quatro horas da madrugada. Há quinze minutos tocou pela primeira vez o telefone. Voltou a tocar exactamente cada cinco minutos. Detenho-me junto dele e olho, estendo a mão direita e toco no auscultador sem o levantar. Dentro de dois minutos voltará a tocar. Interrogo-me se Immaculada também terá vindo com eles, se vou ouvir a sua voz quando finalmente me render e levantar  o  telefone e o aproximar do ouvido.

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