A pianista Maria João Pires anuncia afastamento prolongado por problema de saúde. Além dos concertos de Junho em Portugal, ficam também cancelados os concertos no Japão:
«Estimados amigos, lamento informar-vos que terei de me afastar dos palcos por algum tempo. Surgiu-me um problema de saúde cerebrovascular, que encaro como um sinal, talvez um aviso.»
Lembramos
palavras que José Saramago escreveu, Novembro de 2009, sobre Maria João
Pires, e que se encontram publicadas no 2º volume de O Caderno:
«Maria João Pires não teve muita sorte
com o país em que nasceu. Sessenta anos de carreira (e que extraordinária
carreira a sua) justificariam uma homenagem de âmbito nacional capaz de
expressar a nossa gratidão por pisarmos o mesmo chão e respirarmos o mesmo ar.
Não será assim, pelos vistos, ainda que não lhe venham a faltar na terra
portuguesa outras manifestações de admiração e respeito. Foi em casa de uns
amigos que a ouvi pela primeira vez, quando ela não passava de uma adolescente
que, com o seu frágil corpo, mal parecia haver saído da infância, e que me fez
temer se os braços e as mãos lhe chegariam para enfrentar-se ao gigantesco
teclado. O piano familiar, vertical, talvez não estivesse em perfeito estado de
afinação, mas as primeiras notas saltaram límpidas, cristalinas, dando-me a
sensação, não de serem a mera consequência do choque dos martelos com as
cordas, mas de haverem brotado directamente dos dedos da própria pianista. Foi
o meu baptismo na arte de Maria João Pires. Depois, ao longo dos anos, sempre
que ela, já viajante emérita, aparecia por Lisboa a dar os seus recitais, eu lá
estava, rogando às potestades celestes que a protegessem do mau-olhado, de um
simples sopro de ar que a perturbasse. Talvez por efeito das minhas petições e
do crédito que tenho no céu, todos os concertos e recitais de Maria João Pires
a que assisti chegaram felizmente ao seu termo. Desta vez, por razões de
distância e também de saúde, não poderei estar presente, dar palmas e beijar as
suas mãos tão cheias de música, de humanidade, de beleza. Por tudo o que me fez
ouvir e sentir, Maria João, obrigado.»

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