Embarque em Brindisi
Agustina Bessa-Luís
Capa: Luís Filipe
Cunha
Parque Expo 98,
Lisboa Abril de 1998
Foi em Brindisi. Não sei me expliquei bem, as letras não servem às vezes ao coração da realidade. Mas penso que um rosto humano é feito de momentos assim, de continuidade, de paixão que não erve aos homens senão para que resistam ao seu grande espanto de viver. Assim é. Vejo Brindisi ao cair da tarde, cidade portuária e desenganada, com grandes bonecas encaixadas às portas, vestidas de azul e rosa. Como meretrizes honestas e sem alma. E os inglesinhos de compridos cabelos, de queixos agudos, feios. A excentricidade deles, os moços de bordo em mangas de camisa, a fuligem nos bancos do convés, a partida de Brindisi à noite e o rulho do mar à noite. E aquele imóvel rosto, aquela recusa fria, o sádico encanto do amor que resistia a participar e a ser. E a beleza, prodígio para sempre pobre e desamparado, não embarcara em Brindisi. Não embarcava em parte alguma, eu tinha a certeza disso.
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