Gare du Midi. Chove. Espero por um combóio que só daqui a quatro horas vem. Podia ir dar uma volta, ver coisas que não cheguei a ver, mas não vou. Estou triste e desanimado como um locomotiva fria aqui ao pé. Andar mais, era entristecer e desanimar mais ainda. Ao partir, contra a minha própria unidade, trazia escondido na maior fundura de mim o desejo de abrir ao lado do postigo ibérico, que me revela a vida, amplas e europeias janelas. Afinal, quanto mais ando, mais cercado me sinto de muros e de penumbra. O que levo daqui é uma espécie de luar gelado que não serve de nada na minha quente noite peninsular.
Miguel Torga em Diário, Volume I, Coimbra, Maio de 1942
Legenda: Gare du Midi, óleo de José Manuel Gil Gonzalez
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