domingo, 22 de janeiro de 2017

CADEIRAS PEQUENAS E INCONFORTÁVEIS


3-3-63
Relembrando cinema, velhos filmes e as sessões da infância no velho «Nacional» (onde nunca entro sem que uma mão misteriosa me aperte o coração quando olho para aquelas cadeiras pequenas e inconfortáveis das 8 primeiras filas – o nosso reino!) recordei o 1º filme que vi ou que eu penso ser o 1º - «Os Aventureiros dos mares do Sul» com T(yrone) Power e já não me lembro mais quem. Mas o que me alegra nessa lembrança é o reconhecimento de que desde criança, a m/ intuição me fazia aderir aos aspectos construtivos dos sentimentos e factos. Não me lembro de nada do filme, a não ser que o «herói» naufragava e era atirado para as praias de uma ilha dos mares do Sul. Lembro-me sim do seu amor com uma nativa e do que até hoje guardo como prova desse amor: uma bela cena, na praia, atrás dumas rochas, quando a aldeia vai surpreender o herói, ensinando a moça a ler e a escrever nas areias da praia! Esse aspecto construtivo do amor, ficou sedimentado em mim criança e ainda hoje, creio, que é o que me dá a medida real dum amor, é a esse aspecto construtivo que refiro sempre qdo. tenho de comparar, imaginar, referir. É bom reconhecer, a mais de 20 anos de distância, a persistência das boas qualidades inatas que nem a «sordidez» e a estupidez» depois de alguns anos de vida post-adolescente, conseguiram afastar. E que tornaram possível o melhoramento de mim com o mesmo amor e a compreensão da minha bela companheira e namorada K.

José Luandino Vieira em Papéis da Prisão

Legenda: Cinema Nacional, em Luanda. Fotografia do jornal Público.

Sem comentários: