segunda-feira, 21 de abril de 2025

MÚSICA PELA MANHÃ


Esta é a semana em que Abril faz 51 anos.

A Música pela Manhã acompanhará algumas das canções, dos acontecimentos, que marcaram aquela madrugada que esperávamos.

A velha história: todos os começos são difíceis.

Mas poderemos começar com aquela noite de 29 de Março de 1974, no velho Coliseu dos Recreios a escassos 28 dias de passarmos a ser livres.

Pegamos em O Cinéfilo nº 27, datado de 6 de Abril de 1974.

Macário Contumélias, a quem foi dado reportar o acontecimento, escreveu assim:

«A coisa chamava-se – chamou-se o I Encontro da Canção. Estavam marcados para se encontrar com a malta o Quarteto de Marcos Resende, o duo Carlos Alberto Moniz e Maria do Amparo, Manuel José Soares, Carlos Paredes (com Fernando Alvim); o conjunto espanhol Vino Tinto, que a televisão já vira; Pablo Guerreiro; Ary dos Santos; José Barata Moura; Manuel Freire; Fernando Tordo; José Jorge Letria; o conjunto Intróito; Adriano Correia de Oliveira; José Afonso; Ruy Mingas e Paulo de Carvalho; cá por mim fui lá, por dever de ofício, a contar com uma grande estopada. Não que, de um modo geral, eu estivesse com dúvidas sobre a importância da maioria dos convidados no contexto da nova canção portuguesa (embora não percebesse muito bem o que iriam lá fazer dois ou três dos que eram para – e acabaram por estar e não – estar presentes. Nada disso. O que eu temia era que, no meio da confusão, a coisa resultasse numa pepineira intragável. Mas fui! E agora que aquilo já passou, há uns dias largos, ainda guardo em mim uma grande emoção. Fosse lá porque fosse, naquela noite, no Coliseu, senti-me. E isso não nos acontece todos os dias. Isso é importante!»
Para cima de cinco mil encheram por completo o Coliseu dos Recreios em Lisboa e assistiram a algo que lhes marcou as vidas.

Tinha acontecido o 16 de Março, a confusão instalada, alguns a dizerem dizer que estava para breve, muitos, tantas vezes esperançados e depois frustrados a não acreditarem.

Naquela noite de emoções várias, passadas as portas do Coliseu, poderíamos pensar que talvez se aproximasse, assim como o poeta dissera à rapariga, o tal dia em que a Primavera se soltaria no País de Abril.

Assim foi.

De uma vez só, ficámos a saber que o acto de cantar é um acto que responsabiliza a pessoa que canta e as que o escutam.


Vou assinalar três passos da reportagem do Mário Contumélias:

1.

«Carlos Paredes Guitarra foi recebido com gritos isolados de «Tira a gravata, pá». Mas veio a música, e aquela sim, não era comercial, ou por outra, aquela era para ouvir com todo o corpo.

Os Verdes Anos foram impostos pelo público, muito mais maduro do que se pensaria.



2. 

E entrou, /De pé como um poeta ou um cavalo/, José Carlos Ary dos Santos. Entrou no palco entre assobios e aplausos. Pense eu o que pensar do Ary, como poeta ou declamador, a verdade é que ele tem muita força (aquela força que havia de faltar a Fernando Tordo). Eu venho cá dizer. Se não gostarem manifestem-se no fim.

E a malta manifestou-se. Aplaudindo o Soneto Presente. Com dois poemas, Zé Carlos, face à insistência do público, diz um terceiro, o Retrato de Alves Redol.



3.

«Quando, depois de Adriano acabar de cantar, José Afonso se aproximou do microfone, as palmas rebentaram. Venho aqui cantar uma canção, a GRÂNDOLA, disse Zeca.

Cerraram-se as luzes, e toda a sla, todos os 5 mil, de pé, entoaram em coro os versos da canção. Braços dados, corpos balanceando, pés, batendo no chão.

Quando o Zeca acabou, o público ficou lá, erguido ainda, nos camarotes, na galeria, na plateia, na geral, em todo o lado onde cabia mais um.»

Sem comentários: