ZIP 30.020/S -
1971
Pare, Escute e Olhe - Arte Poética
Um muito
interessante "single" do pré-25 de Abril, que reuniu algum sucesso
popular, comprado na então sucursal da “Discoteca Roma”, na Rua Morais Soares,
esquina com a Praça Paiva Couceiro (em Lisboa) e produzido por
"Zip-Zip".
A loja, com duas simpatiquíssimas e competentes empregadas, não resistiu aos
tempos de Abril e fechou. Mais tarde a casa-mãe também fechou as portas
na Av. de Roma. Para não variar instalou-se lá uma agência bancária e agora é
café a armar ao fino.
À época, e ao nível da pequena banheira onde vivíamos (vivemos), este disco
originou uma leve e doméstica polémica, qualquer coisa como mosquitos por
cordas.
Por uma estranha omissão (tipográfica ou qualquer outra) não consta da ficha do
disco o nome de Hélia Correia como autora do poema “Arte Poética”, face B do
"single".
O disco revela apenas o nome de José Jorge Letria e daí poder inferir-se que
Letria é o responsável, não só da música, como da letra.
O suplemento “Juvenil” do jornal “República” de 19 de Outubro de 1971, fazia
publicar um “Para Que Conste” em que o facto é denunciado e, ao mesmo tempo, se
revelava que “mesmo em espectáculos públicos não tem feito Jorge Letria
qualquer alusão ao nome de Hélia Correia” e exigia-se a respectiva rectificação
e invocavam-se direitos de autor e reprodução.
Já que estamos em maré de documentos e curiosidades, diga-se que, na contracapa
do disco, José Jorge Letria fez publicar um texto de sua autoria: “É do
Silêncio Que Vos Falo” e que aqui se reproduz:
“Foi mais de um ano de silêncio (depois do primeiro
disco-fracassado). Mais de um ano de silêncio inteiramente assumido.
Voluntariamente aceite. É fora dos circuitos normais (televisão, rádio,
promoção, venda) que, dolorosamente, sem trincheiras nem disfarces, se
descobrem os amigos (?), que se aprende a abominar a hipocrisia e a falsa
coerência, a miséria das intenções, a ignorância das coisas elementares.
"É no silêncio (um certo silêncio, entenda-se), que se descobre a
utilidade das palavras. O seu fogo. A sua forma exacta. A sua acutilante
facilidade de chegar onde mais ninguém chega. E ao mesmo tempo a sua infinita
pobreza. A sua enorme timidez. Sim, porque as palavras são tímidas. Haverá
alguém que duvide?
"Para mim conservo a certeza de que está tudo ainda por fazer. Não são meia dúzia de discos ou de frases publicitárias, publicamente ditas, que definem uma música e lhe dão a necessária consistência. Desfaçam-se pois os equívocos. Já não é sem tempo. A quem me ouvir deixo, entretanto, a possibilidade de transformar em acto (ou quase) o que no canto se propõe. Se isso não acontecer fico, pelo menos, com a certeza de ter levado até ao fim a minha ingenuidade. Ou seja o silêncio donde partiu. Para os que ficarem pelo caminho vai também a minha saudação.”

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