terça-feira, 25 de outubro de 2011

SARAMAGUEANDO


 Em Dezembro de 1981, pelo seu Levantado do Chão, José Saramago foi distinguido com o Prémio Cidade de Lisboa.

Antes já o prémio fora atribuído a Maria Velho da Costa (Casas Pardas, 1957), Carlos de Oliveira (Finisterra, Carlos de Oliveira 1978) e Augusto Abelaira (Sem Tecto Entre Ruínas, 1979) pelo que Saramago ficava em boa companhia e isso era muito mais importante que o valor pecuniário do prémio, pouco mais do que simbólico, de 50 contos.

 Apenas quase sete meses passados, o prémio foi entregue no Salão Nobre da Câmara Municipal de Lisboa por pelo seu presidente Krus Abecassis.

Do discurso de José Saramago:

Decida cada um de nós se foi ou não excessiva a demora, se ele se justificou ou não por mais urgentes obrigações, se faz ou não sentido manifestar eu esta estranheza. Afinal, quem sabe se não será de bom aviso deixar que o tempo dissipe os vapores da imodéstia, os fumos da presunção que, inevitavelmente atordoam a cabeça do premiado nas primeiras horas, quando lhe chovem em cima abraços, telegramas, palavras calorosas e também, inevitavelmente, a morrinha dos despeitados. (…)

Fala-se interminavelmente de cultura, mas não se vive a cultura. Comemoram-se os escritores que morrem, mas nada se faz para garantir a actividade dos vivos. Afirma-se que a cultura é una e nacional, mas impede-se, ou dificulta-se, ou menospreza-se a sua divulgação nos meios de comunicação social. Apregoa-se o pluralismo, fomenta-se a letra única. Teoriza-se o consenso, pratica-se a excomunhão. (…)

Quem responde por não terem os escritores condições sequer mínimas para exercer o seu ofício com a responsabilidade inteira de quem não que servir outros patrões senão esse, exigentíssimo, que é a criação literária? Insisto recalcamentos mais o direito à profissão de escritor como expressão particular de um geral direito ao trabalho. Cuidemos um pouco menos d carreira pessoal e um pouco mais da reivindicação colectiva. Quando cada um de nós, se assim o quis, for escritor em todas as horas do seu dia, talvez não escreva melhor por isso, mas acrescentará um novo e legítimo orgulho ao talento que tiver, e se é verdade que de talento todos achamos ter que baste, parece-me que de orgulho deveríamos andar mais bem servidos.

Krus Abecassis, no seu discurso:

Tenho muito gosto em dizer, publicamente, que não me perturba dar um prémio a um livro que exprime uma concepção do mundo inteiramente oposta à minha e à dos cidadãos que me elegeram, nomeadamente, como acontece agora, se trarta de um livro que está muito bem escrito.

A reportagem que o Portugal Hoje (02.06.1982) publicou sobre a entrega do prémio, referia que o autor tinha um outro livro no prelo que sairia em Outubro – Memorial do Convento.

Segundo nos afirmou, é um livro tão importante como Levantado Chão, que lhe exigiu muito estudo.

Eu demoro muito tempo a preparar os meus livros, a estudar, a pesquisar, mas quando começo a escrevê-los sou muito rápido.

Levantado do Chão foi escrito em cinco meses, depois de dois anos de estar a pensá-lo – disse-nos.

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