quinta-feira, 27 de outubro de 2011

EM REDOR DE LOBO ANTUNES


Outubro chegado, livro de António Lobo Antunes publicado.
E não só.
Como o Natal está aí à porta, mesmo que seja um Natal de muito pouco dinheiro, já se alinham os livros dos treinadores e jogadores de futebol, dos pivot da televisão, dos Paulo Coelho, das Margarida Rebelo Pinto, livros destinados a serem oferecidos a quem não lê livros.
 Acontece até que aquele rapaz, o Rodrigues dos Santos, acordou um destes dias com o cu virado para a lua, e, gratuitamente (?)  recebeu, um chuto, forte e colocado, de publicidade, com a Igreja Católica a arrasar o último livro, que o rapaz nem sequer sabe do que fala e esse falar tem a ver com o ter escrito que Cristo não era cristão e Maria não podia ser virgem.
Não sou tipo para odiar, mas fui coleccionando, ao longo dos tempos, alguns ódiozinhos de estimação. Para referir apenas escritores, cito três: Vasco da Graça Moura, Agustina Bessa Luís e António Lobo Antunes.
O primeiro porque sendo um belíssimo poeta, um excelente tradutor, entretém-se a fazer loas a Cavaco e ao PSD, a segunda porque sim – nunca li qualquer livro e as razões não se prendem com as qualidades da senhora que, dizem, as tem profusamente, mas por histórias que vêm muito detrás  (um dia as trarei aqui) quando nunca apoiou os seus pares na luta contra a ditadura, o terceiro por se ter tornado um chato.
Nunca percebi – não deve ser para perceber – porque Lobo Antunes passou os últimos anos a denegrir José Saramago, mas o que fez transbordar a taça da paciência foi, ter dito numa entrevista, que não tinha a menor dúvida de que não há, na língua portuguesa, quem lhe chegue aos calcanhares.

Tenho a certeza que serei lido para sempre!
Humildade e vaidade em excesso sempre me desconsertam.
Curiosamente, o meu contacto com António Lobo Antunes nasce com uma entrevista que deu ao jornalista Carlos Miranda de «A Bola», quando o jornal não era o pasquim que hoje é.
Perdi o recorte dessa entrevista, mas arrisco que terá sido no ano de 1982 porque a entrevista girava à volta do primeiro livro Memória de Elefante, a entrevista em que o autor declara a sua loucura benfiquista ao ponto de se sentar nas bancadas de gorro e bandeira.
Comprei o livro, fiquei um entusiasta-mor de Lobo Antunes e comprei, mal punham pé em escaparate de livraria, os que se seguiram.
 Mas à medida que foram sendo publicados ia também crescendo um certo esmorecimento.
Os livros continuavam a ser bem escritos mas tornaram-se pouco entusiasmantes. 

Passei a demorar muito tempo para que terminasse um livro. Desde  Exortação aos Crocodilos que já não os acabo – e o que detesto não conseguir acabar um livro!... – e Boa Tarde às Coisas Aqui Em Baixo, uma oferta natalícia, nem o iniciei.
O novo livro chama-se Comissão das Lágrimas – Lobo Antunes continua encontrar títulos felizes para os seus livros – e anda à volta do período da vida política angolana, Março 1977, que envolveu Nito Alves e Agostinho Neto.
Diz quem já leu o livro, que Lobo Antunes continua a não fazer muita pesquisa histórica apenas se orientando por vozes, vozes que lhe chegam, vozes que e com essas vozes conta a história.
 Não irei comprar o livro e, como este Natal é um Natal negro, não dou – apenas a netaria está a salvo - nem recebo prendas pelo que nem sequer corro o risco de o ter
Não é que me orgulhe – nem pouco nem muito - pela companhia, mas Clara Ferreira Alves deixa cair, na revista Actual do Expresso, palavras que compreendo muito bem:
Alguns livros são ilegíveis, puro contorcionismo e acrobacia palavrosa, discursos e vozes sem rumo nem identificação, narrativa sem estrutura, personagens apenas nomeadas que nunca chegam a formar-se, muito menos a identificar-se fora da cabeça do escritor. Ele sabe do que está a falar, os leitores. O escritor deixa os livros.
Estas palavras fazem-me lembrar o meu pai, quando dizia que, mal dos escritores que tem de ir a casa de cada leitor explicar o que escreveu, o que, no fundo, pretendeu dizer.
Dentro desta amargura gostaria de ressalvar que aprecia muito as crónicas do António Lobo Antunes que as leio, com agrado e gosto, em jornais e revistas e depois, mal sejam reunidas em livro, apresso-me a comprá-lo.
As crónicas de António Lobo Antunes falam do quotidiano das gentes. Numa linguagem simples, clara, bonita e terna.
É pelas suas crónicas que ainda saúdo António Lobo Antunes.

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