sexta-feira, 25 de janeiro de 2019

À CONVERSA


Mas, descontada a terminologia, foi sempre mantendo uma atitude crítica em relação ao modo como a literatura se foi tornando indistinguível de outros produtos de consumo. E saberá do que fala, uma vez que foi técnico de publicidade.

A grande tragédia da minha vida foi ser publicitário. Digo isto muito seriamente. Uma vida que fui obrigado a viver de forma...

Esquizofrénica?
           
Exactamente, a palavra é essa. Nessa altura, a publicidade era vista pelos bem pensantes como um trabalho quase de prostituição. O facto é que não consegui arranjar emprego com o curso de Direito, e também não me interessava muito ser advogado. E na função pública estava proibido de trabalhar por razões políticas. Eu achava que um dia poderia ir para a diplomacia. Via o Saint-John Perse, esses tipos, o Paul Claudel, e achava que era o que me convinha. Sentava-me a uma secretária e tinha tempo para fazer versos. Não fazia mais nada, só versos, e andava com uma faixa ao peito. É ridículo, mas é verdade que pensava nisto. Também podia ter ido para Medicina. E se calhar devia ter ido. Houve um professor que insistiu muito comigo, mas acabei por ir para Direito. Sempre com a expectativa de que um dia o Salazar ia morrer – caía de uma cadeira qualquer –, e depois havia liberdade e eu podia ir para a diplomacia.

Entrevista de Luís Miguel Queirós a Armando Silva Carvalho em Público 1 de Junho de 2017

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