A tarde cai amaciando a terra,
E enchendo-a de
miragens tentadoras
Enquanto o Sol,
Nos últimos
alentos,
Se prende aos
galhos de um arbusto
Que, ressequido, à
beira de uma ermida,
Parece o próprio
símbolo da Vida.
De enxada ao
ombro, alguns trabalhadores,
Pisam o pó e as
pedras dos caminhos
- Como bandeiras
humanas
Movidas pelo
infortúnio,
Sem alegria,
sórdidos, curvados,
Mas enormes no seu
frémito de luta!
Ah!, nem a Morte
quer os homens
Quando eles são
desgraçados!
As estrelas lá, no
alto,
Riscam cintilantes
brilhos.
E em bandos –
Os maltrapilhos,
Silenciosos e
ateus,
Zombam do Amor
E até de Deus!
A miséria
Quando atola
O homem nos seus
negros labirintos,
Dá-lhe, também, a
loucura
Dos mais trágicos
instintos…
Agora, neste
momento,
A noite –
É a imensa
realidade…
E eu julgo ver a
justiça
Afundar-se na
penumbra
Da sua inútil
verdade.
António Botto
Legenda: retrato de António Botto por Almada
Negreiros
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