
A edição do “Diário Popular” de 5 de Setembro de 1968, traz larga reportagem sobre a festa dos Schlumberger.
Nuno Rocha foi o “grande repórter” e Vera Lagoa, “bisbilhutando”, assina uma página inteira, que tem este começo:
“São sete horas da manhã. Acabo de chegar a casa, vinda da quinta do Vinagre. Vinda da festa que os Schlumberger ofereceram. Da festa para a qual foram convidadas celebridades internacionais. Para a qual foram convidadas celebridades nacionais.
“Podia começar por dizer que o Sol começa a nascer mesmo em frente dos meus olhos, mesmo em frente da minha janela, mesmo em frente da minha máquina de escrever. Podia. Mas já toda a gente conhece o nascer do Sol. Ninguém está interessado em saber o que avisto da minha janela. A verdade é que se espera que conte a festa. Mas também ninguém tem prazer em se sentar à máquina às sete da manhã para descrever flores, vestidos, jóias, ceias, orquestras. Sinceramente, neste momento, com o tal Sol a surgir, apetecia-me muito mais falar dele do que da noite que acabou. Mas como não é oportuno falar do Sol que a todos aquece, falarei da noite que coube aos escolhidos.”Mais à frente, Vera Lagoa cronica que um cabeleireiro trouxe para Portugal vinte quilos de postiços e atalha: “Ora eu peguei nos meus quarenta e sete gramas de postiço platinado e fui pentear-me à Odete, do Cabeleireiro ro Amaro, fui a correr comprar uns sapatos na Lúcia, maquilhei-me na Loretti e vesti-me na Carmen Modas. Tudo nacional. As peles? Essas eram também nacionais, mas emprestadas. Fiz um vistão.”
Há-de depois confessar que tem “um bloco cheio de apontamentos, mas nem sequer tenho coragem para os consultar. Vai de cor. Talvez resulte.”
Não resultou muito bem.

Quis lembrar-se da cor do sari da Begum Aga Khan, mas perdeu-se. “Talvez fosse cor de morango. Talvez fosse outro cor de rosa" e, lamentavelmente, acabou por não ver a Mary Espírito Santo, “que foi uma das primeiras a chegar. Mas disseram-me que estava de branco e muito elegante”.
Os nomes de um ror de gente invadem a prosa de Vera Lagoa e aproveita para lembrar que a dona da casa tinha dito que “não consentiria pijamas, mas muitas calças e bermudas com túnicas apareceram.”, mas como eram “Tão bonitos ninguém se opôs a que entrassem. Apenas uma senhora foi mandada para trás. Vinha de vestido curto e casaco de fazenda. Para um baile de gala, de facto, era demais."
Mais gente, muita gente,: “Audrey Hepburn foi eleita a mais simpática. Dançou com toda a gente, foi muitíssimo gentil, deixou a melhor das interpretações. Mas Gina Lolobrigida estava pirosíssima. Sempre a achei assim, mas desta vez exorbitou. Foi, por unanimidade, eleita a mais antipática, pois recusou-se a dançar com quem não conhecia. Num baile particular, devia dançar com toda a gente. Além disso, parecia, como de costume, um reclame a produtos para desenvolvimento de certas glândulas… Também era horroroso o homem de bigode que a acompanhava.”
Chegada aqui, Vera Lagoa, está cansada.
“E vou despedir-me. Devo dizer bom dia ou boa-noite? Não sei. Por isso, o mais certo, o mais correcto, é dizer: “Até amanhã.”
(Para continuar).
4 comentários:
Estoy interesado en la historia completa de la fiesta Vip en Portugal, es posible?
Terei que ir ao sótão para verificar se ainda por lá estão os recortes dos jornais sobre essas festas. Oportunamente lhe darei notícia.
Muchas gracias, espero que así sea.
Caríssimo viajante:
Lamentavelmente, não consigo satisfazer o seu interesse.
As minhas buscas ainda encontraram jornais e recortes da Chegada do Primeiro Homem à Lua, o fim da Guerra do Vietname, O grande Incêndio do Chiado em Lisboa, O início da Guerra do Iraque, o 11 de Setembro mas nada das festas milionárias realizadas em Lisboa em 1968. Então eu tinha 23 anos e, hoje, não consigo lembrar das razões que me levaram a guardar esses jornais. Quando em 2019 coloquei esses recortes por aqui, não entendendo, então, o «interesse histórico», e dada a imensa falta de espaço caseiro que vou tendo, os terei colocado no lixo. Mas também não tenho a certeza de o ter feito.
Na apresentação desses recortes em Setembro de 2010, escrevi:
«Quando, por qualquer motivo, mexo nas pastas e caixas que, há anos por aqui andam a aguardar uma vista de olhos para uma classificação em dossier, ou reciclagem, deparo-me com as coisas mais incríveis.
Agora encontrei cinco-semanas-cinco de páginas do “Diário Popular” dando conta das festas milionárias que, em 1968, se realizaram em Sintra. Não se tratam de simples recortes, são mesmo páginas inteiras.
Com que fim foram guardados?»
Talvez consiga entender a tristeza com que lhe revelo esta impossibilidade de o ajudar.
Abraço.
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