quarta-feira, 1 de setembro de 2010

O CONTADOR DE GAIVOTAS



"Ofício difícil, este de vaguear pela praia.
Aceitei uma vaga azul,
a sul
do pararelo do Mú.
Faço-o com empenho,
mas não é fácil.
Sem horários,
o tempo é tecido nas marés,
pela dança do sol com a lua.
O recenseamento das gaivotas
é registado com rigor no quadro de areia da praia.
Mas isso tem os seus preceitos e não pode ser em qualquer sítio.
Tem que ser naquela zona onde o mar vem ler.
Desconheço o que acontece depois,
mas seguramente o mar guardará tudo na memória
em água e sal
para eterna conservação.
Tenho ainda outra missão
e dela só posso falar muito genericamente
por causa do segredo profissional.
Guardo pares de pegadas
Deixadas muito paralelamente
na areia molhada de quando a maré se agacha.
A seguir o mar, na sua regularidade,
Recolhe-as e, depois de tratada a informação,
Permite a leitura aos interessados.
É por isso que os amantes procuram a beira-mar,
sobretudo naquela hora mágica que antecede o crepúsculo.
E quando dizem “amo-te” é porque se asseguraram
que isso está escrito lá no fundo,
na horizontal do mar,
só para quem sabe ler na água."


Gregório Salvaterra, contador de gaivotas e poeta público, pode ser encontrado aqui.

Legenda: Imagem encontrada aqui.

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