Crónica de hoje de Manuel António Pina no “Jornal de Notícias”:
“Cavaco Silva parece ter conseguido ontem um pleno com o discurso que proferiu na cerimónia evocativa do 5 de Outubro. De facto, mais reserva menos reserva, todos os partidos descobriram por fim (já não era sem tempo) algo positivo nesse discurso.
Até o seu arqui-adversário, Mário Soares. E até eu, agora um pouco mais sossegado por saber que as preocupações presidenciais não se esgotam na questão do sorriso das vacas açorianas. Mas permita-se-me, a mim que suspeito de unanimismos (a culpa não é minha, é das más companhias, principalmente as leituras de livros de História).
Pois que, para haver unanimidade entre fracções tão díspares do quadro ideológico parlamentar, há-de provavelmente ser muito simples, ou muito vago, o denominador comum. Ou então - e, depois da leitura da obra em causa, inclino-me para essa hipótese - tratar-se-á de um discurso de tipo oracular, espécie de fato de medida universal e geometria variável onde cabem tanto magros como gordos.
O PSD viu nele "realismo" e "motivação"; o CDS-PP apelos ao "realismo", à "produção nacional", à "ponderação" e à "solidariedade"; o PS a importância do "crescimento sustentável"; o PCP o apelo ao "combate ao desemprego" e à "produtividade nacional"; e o BE o apelo ao "combate ao desemprego" e ao "crescimento".
Como diz Schopenhauer, vemos leões nas nuvens como vemos sentido na História: não porque eles lá estejam, mas porque procuramos vê-los.”
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