segunda-feira, 29 de setembro de 2025

ESCREVO PARA ABRIR UM ESPAÇO MÓVEL

Escrevo para abrir um espaço móvel

para que em obscurecidas vias o sangue corra

para que devagar a surpresa liberte a página e o rosto

para que a substância ascenda à superfície em claras sílabas

Um rodopio de aves interpõe-se em claras sílabas

Há um perfume que turba o pensamento e o transforma em mãos fluidas

Imagino as sendas silenciosas as dálias o vislumbre

das grandes folhas de cristal aceso a uma canção marinha

Páginas, páginas, a turbulência das vagas, a minúcia

das veredas os insectos e as estrelas do mesmo ombro

de um muro As colheitas do acaso, os campos do abandono

Alguém está deitado sobre o círculo branco, alguém corre

na exaltação dos poros Os candeeiros acendem-se na noite

Que ébria melancolia nos rostos que se inclinam

para o clamor dos violinos e para as grandes quilhas

azuis Nada resta senão a leve cinza dos frutos

e alguns nomes frágeis sobre a mesa alguma areia

 

António Ramos Rosa de As Armas Imprecisas em Obra Poética Vol. II

Sem comentários: