quarta-feira, 23 de julho de 2025

OLHAR AS CAPAS

Tenda dos Milagres

Jorge Amado

Capa: Manuel Dias

Círculo de Leitores, Lisboa, Maio de 1983

Mas é um pão! Ai, meu Deus, um pão de mel! – Eclamou Ana Mercedes, dando um passo à frente, a destacar-se, palmeira tropical, da massa de jornalistas, professores, estudantes, grã-finas, literatos, vadios, ali reunidos, no amplo salão do grande hotel, à espera de James D. Levenson para a entrevista coletiva.

Microfones das estações de rádio, câmaras de televisão, refletores, fotógrafos, cinematografistas, um cipoal de fios elétricos, e por entre eles a jovem repórter do Diário da Manhã atravessou, risonha e rebolosa, como se encarregada pela cidade de receber e saudar o grande homem.

Rebolosa é termo chulo e falso, adjetivo vil para aquela navegação de ancas e seios, em compasso de samba, em ritmo de porta-estandarte de rancho. Muito sexy, a minissaia a exibir-lhe as colunas morenas das coxas, o olhar noturno, o sorriso de lábios semiabertos, um tanto grossos, os dentes ávidos e o umbigo à mostra, toda ela de oiro. Não, não ia a rebolar-se, pois era a própria dança, convite e oferta.

O americano saíra do elevador e detivera-se a olhar a sala e a deixar- -se ver: um metro e noventa de estatura, o físico de esportista, o jeito de ator, cabelos loiros, olhos azul-celeste, cachimbo, quem lhe daria os quarenta e cinco anos de seu curriculum vitae? As fotos de página inteira nas revistas cariocas e paulistas eram responsáveis pelo mulherio presente, mas todas imediatamente constataram: o material ao vivo excedia de muito os retratos. Que homem! Despudorada! — disse uma delas, de peitos de rola; referia-se a Ana Mercedes. Fascinado, o sábio fitou a moça: vinha decidida em sua direção, o umbigo de fora, nunca vira andar tão de dança, corpo assim flexível, rosto de inocência e malícia, branca negra mulata. Veio e parou em sua frente — não era voz, era gorjeio:

 - Alô, boy

-Alô! – gemeu Levenson, retirando o cachimbo da boca para beijar-lhe a mão.

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