A João José Cochofel
Rescendem de aroma os montes
E entre rosas e balidos,
Cantam líricas as fontes.
E outros tantos sentidos
Do alvoroço dos sexos
Espalham-se no ar perplexos.
Agora que o tempo abre
Não há festa de mais festa
Do que ser flor ou ser ave:
Ser a cor e o chilreio
Onde o céu se manifesta,
Donde a poesia me veio.
E os deuses que andaram cá
Bem souberam o que há:
Pois se o caule se abraça a hera
Queres que abrace ninguém?
Como a terra é esposa e mãe,
Vem de noiva a primavera.
Mas, ai, flores, tudo flores,
Nas imagens dos altares,
Na poesia e nos amores
E nas pedras tumulares.
Flores me levem ao céu,
Na terra chorarei eu.
Sim, primavera da vida,
Quanta lágrima perdida
Anda debaixo de chão!
Flores, suor do meu rosto,
Espinhos me dão encosto,
Flores me negam o pão.
Flores, flores olorosas,
Ai, néctar de urnas discretas,
Cai a abelha de fadiga
No pólen, o pão das rosas,
E é esta sempre a cantiga
Que agrada ao mundo e aos poetas.
Afonso Duarte
em Ossadas
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