sábado, 26 de junho de 2010

BOLAS PRÓ PINHAL!



No seu livro “As Palavras dos Outros”, Baptista-Bastos inclui uma entrevista que em tempos fizera a Matateu e publicada na “Almanaque”, uma revista que integrava, para além de Baptista-Bastos, José Cutileiro, Alexandre O’Neill, Augusto Abelaira, Luís Sttau Monteiro, Vasco Pulido Valente, sendo José Cardoso Pires o chefe de redacção.

Matateu (ver aqui) jogou pelo Belenenses entre 1951 e 1964. Desde esse tempo o futebol mudou muito. A incultura dos jogadores nem por isso!

Mais tarde, Baptista-Bastos, há-de considerar que foi uma entrevista “muito cruel”:

“O Matateu era absolutamente invulgar, e não sei se eu devia ter publicado essas coisas. Ele subia a Calçada da Ajuda e os miúdos atrás dele. Todo o gato e cão era Matateu. Ele sentava-se naqueles bancos corridos das tabernas a conversar com as pessoas. Era extremamente popular. Mais tarde tentei ressarcir-me escrevendo uma crónica onde dizia que fui muito cruel. Porque ele diz lá na entrevista: "O Matateu não diz mal de ninguém."Fica um excerto dessa entrevista:

“Matateu não sabe nada de nada e confessa isso abertamente, honradamente, porque a honra, nele não é uma conquista, mas um instinto nato.
Falo com Matateu. Pergunto:
- Costuma ler?
Ele:
- Jornais. A secção desportiva dos jornais. Gosto muito de ver o meu nome nos jornais.
- Sabe quem é Hemingway?
- Não
- E Picasso?
- Esse também não.
- E Aquilino Ribeiro?
- N… Espere aí… Ribeiro, disse Aq… a quê? A-q-u-i-n-i-l-o Ribeiro?
- Não foi Aquinilo Ribeiro, foi Aquilino Ribeiro.
- Pois. Não, não conheço mesmo nada desse nome.
- Gosta de música?
- Um pouco.
- Sabe quem foi Beethoven?
- Não.
- E Wagner?
- Não.
- Mas gosta de música?
- Um pouco. Samba. Sim, gosto de samba
- Sabe quem é Dick Farney?
- Não.
- E Maysa Matarazzo?
- Não
- Que divertimentos prefere?
- O cinema. Mas é uma chatice. Adormeço sempre. As letras daquilo que eles dizem passam a correr. Adormeço sempre.
- Leu alguma vez um livro?
- Nunca até ao fim.
- Porquê?
- Não percebo o que os livros querem dizer.
- Você tem viajado muito. De que país gostou mais?
- Da Itália.
- Porquê?
- Por causa das mulheres. Lindas. Comi algumas. Muito boas. Gosto bastante da Itália. Que rico país para um preto viver!
- Ouça uma coisa. Matateu…
- Olhe, escreva o que quiser; é assim que eu faço sempre, quando estou com um jornalista que me parece bom rapaz. Escreva o que quiser e ponha essas palavras na minha boca. À vontade. Mas não ponha lá que eu disse mal… Matateu não diz mal de ninguém!”


Baptista-Bastos em “As Palavras dos Outros” editado por “Publicações Europa-América", Lisboa 1968

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