segunda-feira, 22 de novembro de 2010

DULCE CABRITA (1928-2010)


Primeiras páginas de Reduto Quase Final de Dinis Machado:

Duas horas da manhã. As palavras procuram-se. A Dulce dorme lá dentro. Sossegadamente, espero.

Mais para o final do livro, esta Dulce há-de pôr-se à conversa com Dinis Machado, há-de perguntar-lhe se ele acredita no sonho. Ele diz: Acredito na utopia, esse território invisível onde se pode semear a maior esperança.

Dulce Cabrita, companheira de Dinis Machado desde 1985 e até à morte do escritor em Outubro de 2008.

Numa entrevista ao Expresso contará:

Feitas as apresentações, oferecem-se palavras. A Dinis só ocorre perguntar a Dulce se sofre muito quando canta. A Dulce só ocorre responder a Dinis que se esfrangalha toda. Seja o que for que isso signifique. Em sobressalto, os dois prosseguem em diálogo. Ela confessa-lhe nunca ter lido o livro de que todos falam. Ele confessa-lhe nunca a ter ouvido cantar. Em fim de cavaqueira, ele oferece-se para a levar a casa. Ela agradece, mas não precisa. Tem carro. Então, pede-lhe ele que o leve ela a casa. Não tem carro. Dulce aceita. Pelo caminho, Dinis pergunta-lhe se é casada. Não. Nunca casou. Despedem-se.

Morreu no passado dia 18, discretamente, como discreta foi toda a sua vida, rodada longe dos holofotes e das primeiras, como acontece a quem simplesmente é grande. Tinha 82 anos.

Cantora lírica, meio-soprano, integrou o coro do Teatro de S. Carlos e fez parte do Coro dos Amadores de Música dirigido por Fernando Lopes Graça de quem foi privilegiada intérprete das suas obras, uma bonita cumplicidade.

Narrar e inventar, e fazer pequenas homenagens. Espero que os homenageados /e os leitores) saibam sorrir. Aposto que sim, dirá Dinis Machado no final da tal conversa com Dulce.

Legenda: Imagem tirada do Expresso

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