Nasci em 1945 e sou ateu.
A minha memória
de papas estende-se desde Pio XII (1939-1958), prolonga-se com João XXIII
(1958-1963), Paulo VI (1963-1978), João Paulo II (1978-2005), Bento XVI
(2005-2013), Francisco (2013-2025).
De Pio XII
apenas tenho memória de ouvir o meu avô referir as suas simpatias nazis. Ao
longo dos tempos tenho ouvido falar que os arquivos do seu papado hão-de ser
publicamente revelados.
Por prazeres
secretos, nunca revelados, o meu pai gostava da 7ª Sinfonia de Beethoven.
Algumas vezes conversámos sobre o desejo de Pio XII, na hora da sua morte, querer
ouvir o «alegreto» da 7ª Sinfonia e do poema que Jorge de Sena escreveu, por
causa deste desejo de Pio XII.
O poema chama-se Como de Vós e é o último poema do seu Livro Fidelidade, publicado em 1955.
Como de Vós
À memória do papa Pio XII que
quis, ouvir, moribundo, o «Alegreto»
da Sétima Sinfonia
de Beethoven
Como de Vós, meu Deus, me fio em tudo,
mesmo no mal que consentis que eu faça,
por ser-Vos indiferente, ou não ser mal,
ou ser convosco um bem que eu não conheço,
importa pouco ou nada que em Vós creia,
que Vos invente ou não a fé que eu tenha,
que a própria fé não prove que existis,
ou que existir não seja a Vossa essência.
Não de existir sois feito, e também não
de ser pensado por quem só confia
em quem lhe fale, em quem o escute ou veja.
Humildemente sei que em Vós confio,
e mesmo isto o sei pouco ou quase esqueço,
pois que de Vós, meu Deus, me fio em tudo
(23 de Dezembro
de 2001)
Em relação a outros papas , admirei imenso João XXIII, João Paulo VI, apesar das promessas, não terá conseguido continuar o trabalho do seu antecessor. João Paulo I foi o que (não) se sabe, um chá pôs fim ao reinado. Nunca tive a mais leve simpatia por João Paulo II, e, para além de outras situações, não será para esquecer o seu imenso desprezo pelo povo de Timor-Leste. Com Bento XVI pouco ou nenhum tempo me demorei e passou-me completamente ao lado.
Até que, no cair de tarde de Março de 2013, o papa recentemente
nomeado, chega à janela e sorridente
diz: «Buona Sera!»
E acrescentou:
«Vós sabeis que o dever do Conclave era dar um Bispo a
Roma. Parece que os meus irmãos Cardeais o foram buscar quase ao fim do mundo.
Eis-me aqui!”
Sabe-se do seu amor
pelos fracos e os mais pobres, aliado a um soberano desprezo pelos mais ricos.
Nunca as
janelas do Vaticano terão sido tão escancaradas e nenhuma destas janelas, que
Francisco abriu, poderão voltar a ser fechadas.
Muita coisa Francisco não conseguiu fazer, não por vontade sua, mas porque o movimento das sacristias, por vezes, ergue-se soberanamente entre as sombras.
Uma cultura nova
passeou pelos corredores do Vaticano. Só alguém com cultura, com sensibilidade,
leva para o seu lado, para com ele trabalhar, um cardeal português, que é um
poeta: José Tolentino de Mendonça, demasiado novo para que, por agora, possa
chegar a Papa, e a que falta aquela vertente popular que distinguiu Francisco.
Amanhã os
cardeais reunir-se-ão, em Conclave.
Não serão fáceis
as conclusões a que terão de chegar. A Igreja atravessa gravíssimos problemas
e, em Conclave ficarão, até ao momento em que fumo branco sai da
chaminé no telhado da Capela Sistina e a Igreja volte a ter o seu chefe.
Notícias lidas,
aqui e ali, apontam para que a Igreja não vai voltar atrás.
Não tenho tanta
certeza.
Velha raposa, a
Igreja não comete o mesmo erro, porque existe muito daquela gente que entende que
um Francisco, tão cedo, não querem voltar a ver sentado no trono de Pedro.
A igreja foge das novas culturas, dos novos
difíceis tempos que vivemos, como o diabo da cruz.

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